sexta-feira, 13 de junho de 2014

HERMES CRIÓFORO, “O BOM PASTOR” Por Artur Felisberto.

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Figura 1: PLANCHE LXXXVII.
Hermès était honoré sous l'épithète de Criophore (Krioforos) dans pinceurs endroits de la Grèce et particulièrement à Tanagra en Béotie. On Citait une statue célèbre de Calamis qui représentait le dieu portant un belier sur ses épaules. – Charles Lenormant; Jean Joseph Antoine Marie de Witte, Élite des monuments céramographiques: matériaux pour l'histoire des religions et des moeurs de l'antiquité (Band 3).
A propósito dos textos de linear-b de Pilos diz-se o seguinte:
Besides the priests and priestesses, certain other religious officials are mentioned: the Karawi Poro (= klarwiphoros or "key-bearer") whose precise function is unclear since it is not known to what such an official had the key.[1]
Segundo este autor,
Karawi-phoros = o que transporta os Karawi < Krawi («cravos») > klawi
> clavis = «chaves»?!
Mas poderiam ser também pregos ou flores denominadas mais tarde por cravos ou cravinas, precisamente em honra do deus sol que os faz desabrochar na primavera. No caso de as portas dos templos já terem, há época, chaves a guarda-las, em vez de deuses como Janus, não se percebe porque é que seriam precisos funcionários sagrados paras transportar algo relativamente desnecessário senão mesmo inexistente.
As chaves seguras são uma invenção moderna.
Os antigos contentavam-se com trancas que só fechavam por dentro e trincos e ferrolhos que seguravam as portas por fora guardando os de dentro apenas do vento e dos animais, porque de roubos e assaltos se guardavam os próprios.
A Arcádia, um dos principais centros da velha raça pelágica, sonharia com Hermes, uma personificação da potência protectora da natureza e especialmente da terra. Originalmente era figurado por um pedaço de madeira encimado por uma cabeça, e ali se fixava um símbolo grosseiro, que entre os povos pastores exprime simplesmente a força procriadora. Esse carácter pastoral desaparece, de resto, rapidamente, para passar ao deus , que em várias tradições é filho de Hermes. Mas o carneiro, que lhe é consagrado, e que vemos às vezes entre os seus atributos, relembra o antigo carácter de divindade campestre, e é sob tal aspecto que se chama Hermes Crióforo, ou porta-carneiro.
De facto, ainda até há bem pouco tempo as portas das nossas aldeias não eram fechadas senão deste modo já que a única segurança contra ladrões seria pouco ou nada ter e, uma boa vizinhança. Nos temos micénicos seria ainda muito mais assim.
Numa análise da terminologia grega para chave no sentido instrumental verificamos que existem termos para “transportar e guardar chaves” em que a “chave” seria inseparável de quem a transportava, não passa disso mesmo, alguém com funções de mordomo ou vigilante.
Kleido-phor-os, bear keys, kleido-phulakion, safe for keeping keys, kleido-phulax, one who keeps the keys, mas kleid-oô (kleis) lock up,
No entanto a função de guardião das chaves das cidades atribuídas a Jano / Hermes parece contraditória com a fama de ladrão sorrateiro deste último particularmente das oferendas aos deuses.

Ver: HERMES, "O GRANDE FILHO DA MÃE" (***)

Porque teriam então os gregos permitido que as funções de guardiões das cidades fossem dadas a um deus ladrão e protector de gatunos? Porque a ordem divina e natural das coisas não se escolhe e no fundo não estavam senão a confirmar a simbiótica dualidade entre polícias e ladrões que terá havido desde sempre e dificilmente deixará alguma vez de haver.
Outros termos são mesmo mais explícitos ao fazerem depender a «chave» de qualidades humanas de vigilância, tais como phrourodomos (< kouro domos) , guarding the house, oikouros, watching or keeping the house. Quer dizer que, mais do que o ferrolhos, eram os que guardavam a casa que eram os verdadeiros guardiães do lar, quase sempre a mulher e governanta, como no caso do conteúdo semântico do termo oikoureô, mas também oi-Kouros como no caso dos guardas do palácio e, em termos mais especializados, os «polícias» ou phulax. Sendo assim, a tradução do genérico kleido-phor-os, bear keys, e seguintes devem ser confrontadas com o facto de kleid-oô (kleis) significar “tomar conta de”.
Figura 2: Hermes, o salteador de estradas com o carneiro como seu “animal de transporte”.
Freixo, filho de Zeus, por causa das artimanhas de sua madrasta, fugiu com sua irmã Hele da Grécia, nas costas de um carneiro, Crius, cujo pelo era de ouro. Na passagem da Europa para a Ásia, Hele caiu no mar e morreu, no local que passou a ser chamado de Helesponto. Freixo continuou a viagem, atravessou o Ponto e chegou à Cólquida, onde, obedecendo a um oráculo, sacrificou Crius, o carneiro e ofereceu a sua pelo no templo de Ares.
Dragão da Cólquida, na mitologia grega, era conhecido como o guardião do velocino de ouro, no qual o herói Jasão e os argonautas conseguiram se apoderar. O dragão da Cólquida era muito grande, mas era muito lento. A lenda diz que dormia com um olho aberto e outro fechado.
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Figura 3: Jasão oferece o velo de ouro na corte olímpica ao divino Zeus. [2]
Muitos heróis tentaram, mas apenas Jasão conseguiu matá-lo. Para conseguir o velocino dourado, os heróis teriam que matar búfalos de fogo, semear seus dentes, lutar com guerreiros cadavéricos nascidos dos dentes, chamados Sparti, derrotá-los para chegar até o dragão e matá-lo. Tudo isso no mesmo dia.
«Polícia» < Lat. politia < Gr. Politeía (governo de cidade)
             (reforço semantico) <= *phaul-ihs < kaur-ish <
Phulax (= vigilante, guarda, sentinela) < phulassô < Kur-ish
(os cortesãos, filhos do deus do Kur) => Phrouros (vigilante, guarda)
< Kaururos < Karkulos > Hercales.
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Se, em sentido real, quem tomava conta da aldeia enquanto conjunto de casas eram os Kouros então os que tomavam conta das habitações, em sentido figurado, eram os deuses galardões, como Janus. Na Grécia este papel pertencia a Hermes na forma de estátuas ictifálicas, os Erma, à entrada das portas das habitações.
Figura 4: Hermes refastelado a cavalo do seu animal de transporte.[3]
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Figura 5: Dionísio, Hermes levando um bode ou um carneiro para ser sacrificado, e Afrodite.[4]
Assim se compreende que outras variantes com o significado relacionados com os «guardas das chave» fosse o verbo oromai (= keep watch), correlativo de oikourêma (= the watch or keeping of a house) e de phrourêma ( that which is watched or guarded).
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O termo substantivo da língua grega relacionado com estes era ourêma (= ouron = urina)! Ora, a conotação entre eles pode entender-se perfeitamente se aceitarmos que é com urina que os animais territoriais marcam os seus domínios. Um instinto genital deste género persistiria na espécie humana na forma de rituais de exibicionismo da força do jacto urinário, de que as uretras bem visíveis em certos repuxos de jardins, na forma de pequenos Erma, poderiam ser mais do que a divinal reminiscência e, a bem explícita erecção dos Erma gregos, a pujante manifestação metafórica. Então, pelo menos no caso de oikourêma, seria evidente a sua relação com o Erma da casa, a esfinge guardiã das pirâmides e das casas dos mortos.
Hermes ó Erma < ourêma < oromai < Hauramahi.
Figura 6: Hermes Crióforo, antepassado do bom pastor.
Se é facto que existiu, relacionado com «chaves», o conceito de kleido-phor-os este poderia de facto ter tido o micénico Karawi-Poro por antepassado mas, pelos vistos, não como sendo aquele que transporta as chaves mas como o que as guarda, ou melhor, como o que guarda e toma conta das casas, palácios e templos.
Como sabemos, no entanto, que houve vários tipos de transportadores sagrados aparentados com o que é sugerido neste nome micénico karawiforos, tais como crióforos, lucíferos e cristóforos suspeitamos que estes não seriam afinal senão os precursores dos modernos transportadores de liteiras e riquexós e dos pálios e dos andores nas modernas procissões católicas.
karawi-poro < *kurka-Kauro > Klautho-wuro > kleido-phor-os.
Ora, karawi parece ser um nome com a estrutura etimológica dos kauroi, tão típicos da Grécia arcaica pelo que, o mais certo seria que estes transportadores sagrados seriam os sacristães que transportavam os andores dos Koiros apolíneos.
Os Karawiporos micénicos seriam análogos a Hermes Crióforo.

Então temos de aceitar que seria muito antiga a ênfase relativa à particular força física dos que, sendo capazes de transportar as estátuas sagradas do divino Apolo, seriam também capazes de tomar conta da segurança dos palácios e dos templos. Dito de outro modo os Karawiporos seriam uma antiga manifestação micénica do ritual do transporte dos cestos das cobras sagradas das faloforías dionisíacas. Em qualquer dos casos, o transporte de deuses solares, fosse em barcas sagradas fosse em andores na forma de discos solar ou de estátuas solares de Apolo, os koiros, ou dos tronos reais, seriam suficientes para geraram o conceito dos kleido-phor-os relacionados com o semantema da segurança pessoal e das habitações de que derivou o significado para «chave».
Figura 7: O Bom Pastor!
João 10: 11 Eu sou o bom pastor; o bom pastor dá a sua vida pelas ovelhas.
12 Mas o que é mercenário, e não pastor, de quem não são as ovelhas, vendo vir o lobo, deixa as ovelhas e foge; e o lobo as arrebata e dispersa.
13 Ora, o mercenário foge porque é mercenário, e não se importa com as ovelhas.
14 Eu sou o bom pastor; conheço as minhas ovelhas, e elas me conhecem,
15 assim como o Pai me conhece e eu conheço o Pai; e dou a minha vida pelas ovelhas.
16 Tenho ainda outras ovelhas que não são deste aprisco; a essas também me importa conduzir, e elas ouvirão a minha voz; e haverá um rebanho e um pastor.
A imagem de Hermes Crióforo acabaria por se confundir com a representação em que Cristo, o deus solar transportado como o cordeiro de Deus da ressurreição pascal, se confunde com o papel do «Bom Pastor» da parábola cristã.
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Em honra desta classe de sacristães teria sido criada a festa kleidagôgia, a procissão dos transportadores de chaves. Mesmo entre eruditos no classicismo parece que existe a possibilidade de confundir Hermes com Dionísio, o que é quase tão grave como confundir o pai com o filho. Na verdade, há que suspeitar que Dionísio é a criança que Hermes transposta ao colo. Esta figuração mítica deve ter sido tão poderosa que permaneceu no cristianismo católico como «S. Cristóvão» [< Espan. Cristobal < Cresto-war < Karish Baal => Cristóforo, «o que transporta Karish, o fogo de Kur»], o santo dos caminheiros e viajantes que transporta o «Deus Menino» ao colo.
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Dionysus was a Greek god of happiness. He was also called Bacchus and Iacchus.
Hesus = "Lord" or "Master". A Celtic agricultural deity of the Essuvi (Gaul), who derived their name from him. His cult was associated with the bull (with three skulls) and he is portrayed with one. He is also represented cutting branches from trees with an axe. According to some he was a bloodthirsty god, while other regard him as a god of commerce (similar to Mercury). His consort is Rosmerta.
«Menino Jesus» <= Dion | Ysius, < Ki kius <= Ki-Kius (> *Kakikus > Yaccus) o filho de Kius, variante de Enki/Eia, e da terra, Ki cujo plural enfático, Kiki pode ter originado Isis, deusa sempre presente nos mistérios da morte e ressurreição do «Filho de Deus». Então, Ysius foi filho de Esus, variante céltica de Hermes / Enki.
Na Figura 2 de “Paposileno com Dionísio” ao colo a força da eternidade do mito do sol nascente mantêm-se!

Figura 8: Paposileno com Dionísio.
Na continuação recente desta mitologia paternal “do homem maduro que, não podendo parir, exalta mesmo assim o seu poder criativo levando enternecido o filho ao colo”, temos S. António de Lisboa, o santo casamenteiro, gentil nas açucenas da fecundidade e com figura de pai extremoso na sua postura de contente por ter o menino Jesus em cima do missal.

Ver: S. ANTÓNIO DE LISBOA (***)

Claro que Hermes Crióforo significa o respeito pela arcaica tradição do cordeiro pascal como símbolo do sacrifício solar no solstício da primavera própria de povos que acabaram de descobrir a pastorícia! O cordeiro acabou por vir a substituir no tempo de Abraão, como é sabido, os sacrifícios humanos dos primogénitos, razão do particular zelo de Hermes pelo “deus menino”, seu filho Dionísio!
Um dos epítetos de Dionísio, Bromios, indicia isso mesmo.
Bromios < Wormihos < Kermisho, lit. Hermes, ou o filho de Erme.
Se Hermes foi filho dum virtual Erme, porventura Kumarbi, então é bem possível que este fosse afinal Paposileno que não seria outro que não “deus pai” Saturno na posição de pai da primeira geração! E a verdade é que quase todos os mitos não envolvem personagens que vão além da 3ª geração, a partir da qual geralmente se esgotam as filiações humanas, eventualmente de deuses filhos de humanos ancestrais divinizados. Neste caso Hermes seria o pai de Dionísio que faria o papel de deus da 3ª geração!
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Figura 9: Apresentação de Dionísio a Paposileno, ao colo de Hermes.[2]
Dionísio e Cristo são ambos deidades duma simpatia ambivalente por constituírem uma estranha evocação de arcaicos ritos solares de luxúria e fertilidade agrícola no seio de mistérios de paixão, morte e ressurreição! Porém, Dionísio ressuscita “deus menino” para nascer fisicamente enquanto Cristo ressuscita para a vida eterna depois de morrer como “filho do homem”!
Claro também que o cordeiro pascal era o «agnus dei», o Agni hindu do fogo que não seria senão uma forma de referência ao sol. De qualquer modo o epíteto de Crióforo é equivalente de Lucífero, o que transporta o «lumen Cristi» depois da sua ressurreição primaveril!
Como deus de fertilidade agrícola, correlativo de Pan, Hermes então teria que ter sido também um deus do amor no masculino, tal como Apolo, só que, não tanto do amor platónico dos aristocratas mas sim do amor genital como só poderia ser o amor de Hermes (neste caso um análogo masculino de Afrodite Pandemos), o mais popular dos deuses helénicos. Desses tempos paleolítico ficou a reminiscência étmica dos hermas que começaram a garantir a fertilidade dos campos, na forma de gigantescos espantalhos que seriam uma caricatura de Hermes Crióforo, e acabaram em épocas mais prosaicas de direito sucessório paternalista a marcar as «bermas» dos campos.
Hermas > wermas > «bermas» & «estremas»!
Crióforo < Kar yau Kur-o > Cari-Kau-Thur => «caricatura».
Bom, tentar explicar as variações pontuais destes mitos nos diversos centros em que eles foram cultivados seria pura perda de tempo e um atentado contra o “direito natural à diferença, de inspiração implícita na da liberdade criativa”. Inovar não é o mesmo que falsificar e é até uma condição para evitar o crime do plagiado. Estes mitos dos deuses de transporte do deus menino são óbvias derivações recentes de antigos mitos solares de que os grifos, os deuses Alfeus e os “deuses de transporte solar”.

Ver: FOGO (***) & HELIOS SKOTAIOS (***) & LÚCIFER (***)

Paposileno < Papau-Kyreno < Papia Kurano, lit. “pai Krono/Saturno”!
A este propósito importa identificar Paposileno, lit. “pai Krono/Saturno”, pai dos sátiros e silenos (logo ele o próprio Pan), avô de Dionísio, pai de Hermes/Miercoles/Hercules. Se Zeus foi pai de Dionísio como resolvemos a pretensão mais provável de ser Hermes o verdadeiro pai?
Hit. Kumarbi < Kurmaki > Hermash > Hermes.
Kumarbi - The supreme god of the Hurrians, creator-god and father of the gods. Father of Hedammu and Ullikummi. Son of Anu. He castrated his father by biting off his genitals and then spat out three gods, Teshub, Tasmisus and the river-god Aranzakh. He married the daughter of a sea-god and they produced the monster Hedammu which came out of the sea to devour animals and humans. When he was overthrown by Teshub, he produced, by impregnating a stone pillar, the giant, Ullikummi, to help him but this being was rendered helpless by Ea. Also called Kumarbi, Ellil, Sumerian Enlil, Elil, Enlil, Bel-Enlil, Great Mountain, Ilu, Lord of the Storm, Narru, Nunammir, Old Bel, Rimm, Rimn, Zulummar, Bel, Illil(os), Ilu, 'windlord', Babylonian Adad, Ea, Hurrian Ellil, Kumarbis or Ellil.
Evidentemente que só é possível explicar os enigmas de Kumarbi admitido uma grande mistura de mitos na mitologia grega. No meio desta caldeirada divina em Hermes confluíram dois deuses, Erme, um deus esquecido mesmo dos sumérios virtualmente chamado Kumarbi na Anatólia, apenas presente nos megalitos ictifálicos e que seria uma sobrevivência do nome do filho e esposo de *Kima e Enki, quiçá uma mera evolução do anterior. Como Kumarbi era um deus supremo dos hititas este facto acabaria por obrigar os mitógrafos recentes a adaptar este papel a Zeus.




[1] MYCENAEAN RELIGION AS EVIDENCED IN THE LINEAR B TEXTS, Texts from Knossos, © Copyright 1996, 1997, Trustees of Dartmouth College.
[2] Restauro cibernético do autor.
[3] Restauro cibernético do autor.
[4] Restauro cibernético do autor.

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