sábado, 14 de fevereiro de 2015

A TEORIA É UM MITO I - A CAUSA MOTORA DA GRAVITAÇÃO, por Artur Felisberto.


I - A CAUSA MOTORA.
Jacques Maritain já havia mostrado que a ciência moderna tem a sua regra formal na matemática e a sua matéria naquilo que é físico. Boutroux, por sua vez, mostra que a impossibilidade de identificação da necessidade abstracta das matemáticas e da constância do comportamento observável dos corpos impede que o ideal da ciência perfeita acalentado pelos modernos se torne realidade.
Em outros termos, as matemáticas não seriam a linguagem última do mundo, pois este apresenta aspectos totalmente distintos daqueles capazes de serem alcançados e abarcados pela linguagem quantitativa. E por isso não há possibilidade de se determinar leis imutáveis a partir somente da matematização daquilo que se observa ser constante. -- Émile Boutroux, matemática e a contingência das leis naturais.
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"A história das descobertas científicas e técnicas revela-nos quanto o espírito humano carece de ideias originais e de imaginação criadora. E mesmo quando as condições exteriores e científicas para o aparecimento de uma ideia já existem há muito, será preciso, na maioria dos casos, uma outra causa exterior a fim de que se chegue a se concretizar. O homem tem, no sentido literal da palavra, que se chocar contra o fato para que a solução lhe apareça. Verdade bem comum e pouco exaltante para nosso orgulho, e que se verifica
perfeitamente no barco de Flettner. E actualmente este exemplo continua espantando todo mundo!"

Mas antes de se dizerem os princípios sobre os quais repousa toda a sua (de Hegel) explicação exaustiva do Universo, há uma questão preliminar: o que é mesmo "explicar" o Universo? Há duas respostas possíveis: 1) explicar é dizer a "causa"; 2) explicar é dizer a "razão". Embora não se entenda de imediato a diferença entre "causa" e "razão" – e saberemos logo abaixo – se percebe que estamos numa primeira encruzilhada do pensamento filosófico que determina rumos completamente diferentes, talvez opostos, de explicação da realidade. E de fato o é. A explicação por causas é uma explicação realista. A explicação por "razão" é uma explicação idealista. -- Para ler Hegel Nóbrega.

Como se pode comprovar mais uma vez os equívocos da física teórica começam quando a metafísica se intromete à bruta a condicionar os caminhos da busca da verdade natural. É falacioso separar a “explicação causal” da “explicação racional” porque tanto a ciência como qualquer tipo de conhecimento realista usa as duas em simultâneo porque uma “explicação causal” sem razão é magia irracional e uma “explicação racional” sem o confronto com as coisas é pura especulação metafísica.

O empirismo e o racionalismo estão ligados, no pensamento científico, por um estranho laço, tão forte como o que une o prazer à dor. Com efeito, um deles triunfa dando razão ao outro: o empirismo precisa ser compreendido; o racionalismo precisa ser aplicado (BACHELARD, 1984, p.4).

Por isso é que uma correlação causal só por si nada comprova se esta não for confrontada com a racionalidade dessa correlação. E por isso também é que a cientificidade idealista de Hegel não será de grande ajuda para trazer a ciência moderna aos trilhos do realismo de que se afastou quando deixou de entender o bom senso do realismo de Aristóteles.

Não é nada agradável ver a ignorância e a grosseria, sem forma nem gosto — incapazes de fixar o pensamento numa proposição abstracta sequer, e menos ainda no conjunto articulado de várias proposições —, garantindo que são, ora a expressão da liberdade e da tolerância do pensar, ora a genialidade. Genialidade que, como hoje grassa na filosofia, antes grassava igualmente na poesia, como é notório. Porém, quando tinha sentido o produzir de tal genialidade em lugar de poesia, o que engendrava era uma prosa trivial; ou, se saia para além da prosa, discursos desvairados. Assim, hoje, um filosofar natural que se julga bom demais para o conceito, e devido à falta de conceito se tem em conta de um pensar intuitivo e poético, lança no mercado combinações caprichosas de uma força de imaginação somente desorganizada por meio do pensamento — imagens que não são carne nem peixe; que nem são poesia nem filosofia.

Em contrapartida, deslizando no leito tranquilo do bom senso, o filosofar natural fornece no máximo uma retórica de verdades banais. Quando lhe objetam a insignificância de suas verdades, então replica asseverando que o sentido e o conteúdo estão presentes no seu coração, e devem estar presentes também no coração dos outros. (***).

Eis um esforço que poderia ser poupado: produzir verdades últimas desse tipo, porque desde muito se encontram, por exemplo, no catecismo, nos provérbios populares etc. Não é difícil apreender tais verdades em sua indeterminação e em sua distorção, nem muitas vezes mostrar na sua consciência e à sua consciência exactamente o oposto. Mas quando essa consciência tenta arrancar-se à confusão que nela se armou, cai numa nova confusão, e protesta dizendo que indiscutivelmente é assim ou assim, e que tudo o mais é sofistica. Sofistica é uma palavra-de-ordem do senso comum contra a razão cultivada; do mesmo modo que a ignorância filosófica caracterizou a filosofia, de uma vez por todas, como sendo “devaneios". (***).

Caso se indague por uma “via régia” para a ciência, não seria possível indicar nenhuma mais cómoda que a de abandonar-se ao bom senso, e no mais, para andar junto com seu tempo e com a filosofia, ler recensões de obras filosóficas. Ler até mesmo seus primeiros parágrafos, que proporcionam os princípios universais dos quais depende tudo, e os prefácios que, junto com a informação histórica, também oferecem uma apreciação a qual, justamente por ser apreciação, paira por cima do que é apreciado. Esse caminho ordinário se faz com roupas de casa; porém o sentimento elevado do eterno, do sagrado, do infinito, veste trajes sacerdotais para percorrer um caminho que já é, ele próprio o ser imediato no centro, a genialidade de profundas ideias originais, e os relâmpagos sublimes do pensamento. Como porém tal profundeza ainda não revela a fonte da essência, esses raios não são ainda o empíreo. Os pensamentos verdadeiros e o entendimento intelectual científica só se alcançam no trabalho do conceito. Só ele pode produzir a universalidade do saber, que não é a indeterminação e a miséria correntes do senso comum, mas um conhecimento cultivado e completo; não é a universalidade extraordinária dos dotes da razão que se corrompe pela preguiça e soberba do génio; mas sim, é a verdade que se desenvolveu até sua forma genuína, e é capaz de ser a propriedade de toda a razão consciente-de-si. (***)

Penso, aliás, que tudo que há de excelente na filosofia de nosso tempo coloca seu próprio valor na cientificidade; e embora outros pensem diversamente, de fato, só pela cientificidade a filosofia se faz valer. Então, posso esperar que essa tentativa de reivindicar a ciência para o conceito, e de apresentá-la nesse seu elemento próprio, há de abrir passagem por meio da verdade interior da Coisa. Devemos estar persuadidos que o verdadeiro tem a natureza de eclodir quando chega o seu tempo, e só quando esse tempo chega se manifesta; por isso nunca se revela cedo demais nem encontra um público despreparado. Também devemos convencer-nos de que o indivíduo precisa desse resultado para se confirmar no que para ele é ainda sua causa solitária, e para experimentar como algo universal a convicção que, de início, só pertence à particularidade. (***)

Vivemos aliás numa época em que a universalidade do espírito está fortemente consolidada, e a singularidade, como convém, tomou-se tanto mais insignificante; em que a universalidade se aferra a toda a sua extensão e riqueza acumulada e as reivindica para si. A parte que cabe à atividade do indivíduo na obra total do espírito só pode ser mínima. Assim ele deve esquecer-se, como já o implica a natureza da ciência. Na verdade, o indivíduo deve vir-a-ser, e também deve fazer, o que lhe for possível; mas não se deve exigir muito dele, já que tampouco pode esperar de si e reclamar para si mesmo. --- PREFÁCIO DO LIVRO “FENOMENOLOGIA DO ESPÍRITO” AUTOR: G.W.F. HEGEL

  
ALBERT EINSTEIN, O GÉNIO DA CONTRADIÇÃO!
A história da Física do final do sec. XIX e da primeira metade do sec. XX e a de Albert Einstein são de tal modo inseparáveis que assim se explica que 100 físicos renomados o elegeram, em 2009, o mais memorável físico de todos os tempos.
O problema fundamental abarcado pelas teorias de Einstein é o tempo, algo cuja natureza não se conhece bem e até agora ninguém, nem mesmo nenhum gémeos, voltou do outro mundo. A Teoria da Relatividade Geral de Einstein, apesar de seu impressionismo e das suas equações de campo, nunca recebeu o prémio Nobel depois de muitas "verificações empíricas".
Ao mesmo tempo, dizer que a gravidade é um efeito geométrico da curvatura do espaço-tempo é dizer muito, e não é de estranhar que ainda existam aspectos da mesma por demonstrar ou até mesmo por compreender e que noventa anos depois se continue a dizer que a gravidade é uma força em todas as escolas.
A mim parece-me que algumas coisas são mais curvaturas da linguagem e das abstracções mentais do que das realidades físicas. -- Mª José T. Molina.
Quando são precisos uma centena de pessoas de renome para votarem a importância de um facto é sinal de que algo ainda não é inteiramente consensual a esse nível! Ultimamente começa a levantar-se a suspeita de que Albert Einstein foi mais um génio de divulgação científica do que um verdadeiro génio capaz de marcar a diferença decisiva na história. De facto a maioria do que se diz e sabe sobre a importância científica deste sábio ou é contraditório ou lendário!
Assim quando se diz que o seu trabalho teórico possibilitou o desenvolvimento da energia atómica, apesar de os mesmos nunca preverem tal possibilidade é mais lenda do que realidade. Ele próprio diz: Minha responsabilidade na questão da “bomba atómica” se limita a uma única intervenção: escrevi uma carta ao Presidente Roosevelt. Ainda assim, poderia adiantar-se que a questão da “bomba atómica” não esgota a questão da energia nuclear o que realmente é assim mas a relação entre ambas foi tão decisiva para o desenvolvimento da física nuclear que quem acredita que não teve responsabilidades nas investigações sobre a “bomba atómica” dificilmente poderá ter tido papel relevante nas investigações sobre as teoria e experimentos que permitiram chegar à bomba atómica e paralelamente à utilização pacífica da energia nuclear porque na verdade, a física teórica de ambas é a mesma.
Quando escreveu Albert Einstein no mesmo "annus mirabilis" de 1905 quatro artigos fundamentais para a Física Moderna nenhum tinha muito a ver especificamente com a física nuclear que na altura ainda era uma utopia. O primeiro artigo de 1905 propôs a ideia dos "quanta de luz" para explicar o efeito fotoelétrico descoberto por Becquerel e Hertz e pondo em causa a teoria ondulatória da luz previstas nas equações de Maxwell.
Logo depois da Experiência do Efeito Compton convenceu os físicos de que a luz pode agir como uma corrente de partículas cuja energia é proporcional à frequência e Einstein pura e simplesmente negligenciou a sua natureza ondulatória essencial definida pelos seus fenómenos de difracção e interferência e reforçada pela mecânica quântica.
A experiência da dupla fenda prova inequivocamente a chamada mecânica quântica, ou ondulatória, que deve basear-se em noções essencialmente diferentes da mecânica clássica.
Ora, esta foi a primeira grande precipitação de Einstein! Se a natureza quântica da luz está hoje perfeitamente definida no fotão a sua natureza ondulatória nunca foi posta em causa sendo um dos paradoxos mais insolúveis da Física moderna precisamente pela teimosia de Einstein em aceitar o Éter como meio de propagação das ondas luminosas e que por isso seria composto por fotões estacionários que vibram à velocidade da luz quando excitada por uma fonte luminosa.
O segundo artigo deste ano foi sobre o movimento browniano, que constitui uma evidência experimental da existência dos átomos. Antes deste artigo, os átomos eram considerados um conceito útil, mas sua existência concreta era ainda controversa.
Se quisermos simplificar podemos dizer que a física atómica começou entretanto mas Einstein pouco mais iria fazer por ela.
O terceiro artigo, de 1905, foi sobre electrodinâmica de corpos em movimento, que introduziu a relatividade restrita.
Supõe que foi então que se estabeleceu uma relação entre os conceitos de tempo e distância o que não é verdade porque o tempo e a distância sempre fez parte das equações do movimento desde Galileu.
No quarto artigo, uma extensão do terceiro, Einstein introduz o conceito de massa inercial. Nele, Einstein deduziu a famosa relação entre a massa e a energia: E = mc2 publicada primeiramente em 1903, pelo italiano Olinto De Pretto.

A CONSERVAÇÃO DO MOVIMENTO
De facto a célebre equação E = mc2 nas equações das “forças vivas” previstas nas das leis da conservação da energia da física clássica mais não são do que a especificação dinâmica do que viria a ser o principio de Lavoisier de que “na natureza nada se perde, nada se cria e tudo se transforma”.
Nada de novo vem ou pode vir a ser, a única mudança que pode ocorrer é uma mudança na justaposição de elemento a elemento. – Empédocles.
Obviamente que só se pode falar no princípio da conservação do que quer que seja na condição de se tratar de algo que se possa conservar o que por definição costuma ser a «substância» das coisas, seja ela qual for, o que é difícil de definir por esta se poder degradar por acção termodinâmica do tempo na complexa cadeia de transformações a que está sujeita. Dito de outro modo, a termodinâmica tende a contradizer o princípio da conservação da energia sendo a crença na sua conservação apenas isso...uma crença de que a quantidade global de movimento se mantenha num universo infinito que era o que Descartes pretendia tomar por primeiro princípio a partir da tradição de Empédocles.
Mas obviamente que as questões metafísicas foram deixadas de parte por Kant sendo portanto o princípio da conservação da energia um postulado impossível de sustentar mesmo a nível local a menos que se tenha por acto de fé que a entropia do universo é igual a sua negantropia o que, como adiante se verá equivale a introduzir no mundo da física a subjectividade que a filosofia moderna tentou expurgar dela...quiçá em vão e sem bons resultados finais.
 De facto, o princípio dito de Lavoisier (mas possivelmente copiado da “De Rerum Natura” de Lucrécio) de que na “na natureza nada se cria, nada se perde e tudo se transforma” não revela uma mera fé na conservação das massas mas, no final, também uma grande confiança na conservação da energia ou seja, na constância da substancia do Universo que corporiza o Ser, o que, só foi inquestionável até à descoberta da termodinâmica.

"A primeira lei da termodinâmica é essencialmente a afirmação do princípio de conservação da energia para sistemas termodinâmicos. (...). Esta primeira lei não coloca limitações sobre as possibilidades de transformação de energia de uma forma para outra".
Ora, essa possibilidade ilimitada de transformação é a base de toda a civilização do progresso. Já a segunda lei da termodinâmica impõe severas limitações: "É ímpossível uma transformação cujo resultado final seja transformar em trabalho todo o calor extraído de uma fonte" (postulado de Kelvin). -- Enrico Fermi.
Assim, parece que o segundo princípio da termodinâmica tem vaticinado a morte térmica do Universo.
A entropia é a inversão do tempo, ou seja, esse aspecto do tempo pelo qual quanto mais se regride no tempo, mais "intenso" é o tempo. E quanto mais se progride mais "diluído" é o tempo. É o tempo em seu aspecto negativo: nós estamos acostumados a pensar no devir do cosmos como um progressivo vir-a-ser, mas, na verdade, trata-se de um regressivo deixar-de-ser sem aniquilar-se: acumula-se um "entulho de ser". Como mostram muito bem os físicos Bernhard e Karl Philbert, não só o espaço é função do tempo, mas o próprio tempo é função do tempo. Não podemos pensar num tempo uniforme e linear e separado das coisas, mas num tempo entrópico, que se degrada com o tempo, tendendo assintoticamente ao fim do próprio tempo; ou, como se poderia dizer satiricamente: "o tempo vai morrer com o tempo" (ou na visão joanina: "Não haverá mais tempo" Ap 10, 6). -- Entrevista com o Dr. Mario Bruno Sproviero, Professor titular.
Tempus edax rerum: O tempo, esse devorador das coisas. Ovídio (Metamorfoses, XV, 234).
Uma visão da termodinâmica baseada na manipulação do tempo, que é um não Ser como adiante se verá, só pode levar a uma ilusão apocalíptica do mundo, comum nas mitologias da criação e destruição cíclica do Cosmos. 
 

O SER E O NADA

O SER é o imediato indeterminado; está livre da determinação em relação à essência, assim como é livre daquilo que pode alcançar o interior de si. Este ser carente de reflexão é o ser como existe imediatamente só em si. Por ser indeterminado, é um ser destituído de qualidade; mas o carácter da sua indeterminação pertence lhe em si apenas em oposição ao determinado ou qualitativo. Mas sendo em geral, opõe-se a ser determinado como tal; mas desta forma a sua própria indeterminação constitui a sua qualidade. Devemos mostrar, portanto, que o primeiro ser é determinado em si mesmo; e com isso, em segundo lugar, transcendendo o ser determinado [ou a existência: Dasein], é ser determinado; mas este, enquanto ser finito, é superado e é a relação infinita do ser para si mesmo; que em terceiro lugar, vai além de ser-por-si.

A. SER: Ser, ser puro - sem qualquer outra determinação. Em seu imediatismo indeterminado é igual apenas a si mesmo, e não é desigual para outro; Não tem diferença nem dentro nem fora. Por meio de qualquer determinação ou conteúdo, que difere no mesmo, ou através do qual é colocado como diferente do outro, não seria preservado em sua pureza. É pura indeterminação e puro vazio. Não há nada nele que se possa intuir, se se puder falar aqui de intuição; ou então ele é apenas esse intuir puro e vazio em si mesmo. Também não há nada nele que se possa pensar, ou então isso é apenas um pensamento vazio.

O ser, o indeterminado imediato, é na realidade o nada, nem mais nem menos que nada.

B. O NADA: Nada, o puro nada; é a simples igualdade consigo mesma, o perfeito vazio, a ausência de determinação e conteúdo; o indistinto em si. - Assim que tu podes falar sobre intuir ou pensar aqui, vale a pena como uma diferença que pode ser intuída ou pensada como algo ou nada. Intuir ou pensar que nada tem, então, um significado; ambos são diferentes e, portanto, nada está (existe) em nossa intuição ou pensamento; ou melhor, é o intuir e pensar vazios, e o mesmo vazio intuir ou pensar que é o puro ser. - O Nada é, portanto, a mesma determinação ou melhor a ausência de determinação, e com isto é em geral a mesma coisa que é o puro ser.

 

C. O DEVIR 1. UNIDADE DE SER E NADA: O Ser puro e o nada puro são, portanto, a mesma coisa. O que constitui a verdade não é nem o ser nem o ser nada, mas aquilo que não supera, mas superou, isto é, o ser [superado] em nada e o nada [superado] em ser. Mas ao mesmo tempo a verdade não é a sua falta de distinção, mas sim que eles não são o mesmo, pois são absolutamente diferentes, mas não estão separados pois são inseparáveis já que imediatamente cada um desaparece no seu oposto. A sua verdade, então, consiste neste movimento do desaparecimento imediato de um no outro: o Devir; um movimento onde os dois são diferentes, mas por meio de uma diferença que foi resolvida imediatamente e ao mesmo tempo.

2. Os momentos do devir: nascer e morrer: O devir é a não separabilidade do Ser e do Nada (Ser/Nada), não a unidade com que se abstrai o ser e o nada; como a unidade do ser e do nada, está determinada a Unidade, ou seja, aquele em que está igualmente o ser e o nada. No entanto, enquanto o ser e o nada não estão ainda separados de cada um do seu outro [cada um deles], cada um não existe. Eles existem, pois nesta unidade (Ser/Nada), portanto, eles são, enquanto desaparecidos, apenas como (entes) superados. Eles decaem de sua auto-subsistência inicialmente representada em momentos que ainda são distintos, mas ao mesmo tempo superados.

Se são tomados segundo esta sua diferença, cada um se acha na mesma unidade com o seu outro. O devir, assim contém o ser e o nada como unidades, cada uma delas é a unidade do ser e do nada; uma é o ser como imediato e como referência ao nada; a outra não é o nada como imediato e como relação ao ser; nestas unidades as determinações são de desigual valor[1].

O devir assim é duplamente determinado. Em uma determinação, o nada é o imediato, isto é, a determinação começa com o nada e isso se relaciona ao ser; isto é, o atravessa. Na outra determinação, o ser é o imediato, isto é, a determinação começa com o ser e isso passa para o nada - vir-a-ser e cessar de ser.

Ambos são o mesmo, o devir, e até mesmo como estas direcções são tão diferentes eles se interpenetram e mutuamente se paralisam ([2]). Uma (direcção) é perecer (morrer); o ser transcende ao nada, mas o nada é exactamente o oposto do ser em si, a passagem para o ser, o vir a ser (nascer). Este futuro é a outra direcção; o nada passa ao ser, mas sendo, igualmente, se supera em si e é antes a passagem ao nada; está cessando de ser (perecendo).

Eles não se superam (excluem) reciprocamente – (no sentido de) que um supera o outro, externamente - mas cada um deles se supera em si mesmo e é, em si mesmo, o seu oposto.

3. O Superar do devir: O equilíbrio no qual o vir-a-ser e o perecer (o nascer e o morrer), é sobretudo o devir. Mas este se recolhe em tranquila unidade. Ser e nada estão nele apenas como desaparecendo (ir morrendo); mas o devir em si, no entanto, é apenas em virtude da sua diversidade. O seu desaparecimento significa, portanto, o desaparecimento do devir ou o desaparecimento do desaparecimento em si. O devir é uma inquietude carente de firmeza, que cai em um resultado de repouso.

Isso também poderia ser expresso assim: o devir é o desaparecimento de ser em nada, e de nada em ser, e o desaparecimento de ser e nada em geral; mas, ao mesmo tempo, repousa por sua vez em serem distintos. Portanto, ela se contradiz em si mesmo, porque unifica em si algo que se opõe; mas tal unificação é destruída.

Este resultado é um desaparecimento, mas não é o nada; como tal, seria apenas uma recaída em uma das determinações já superada e não o resultado do nada e do ser. É a unidade de ser e nada que se tornou uma serena simplicidade. Mas a serena simplicidade é Ser, porém precisamente não por si mesma, mas como determinação do todo.

O devir, como remetente à unidade do ser e do nada, que se encontra como existente, ou seja, tem a forma da unidade unilateral imediata desses momentos, é o Ser determinado (ou existência).

SER OU EXISTÊNCIA DETERMINADA (DAS DASEIN) EXISTÊNCIA [Dasein] significa um ser determinado; sua determinação é uma determinação existente, uma qualidade. Pela sua qualidade, algo está em frente do outro, é mutável e finito, determinado não apenas um contra o outro, mas francamente em si mesmo de forma negativa. Essa sua negação, oposta em primeiro lugar a algo finito, é o infinito; a oposição abstrata, na qual essas determinações aparecem, se resolve na infinitude carecida de oposição, ou seja, no ser-por-si (Absoluto). – A Ciência da Lógica, Georg Wilhelm Friedrich Hegel.

O esquema conceitual subjacente à frase, “a natureza tem horror ao vácuo”, não era, no contexto da época, absurda como pode parecer nos dias atuais. De certa forma, “essa idéia explicava adequadamente certo número de fenômenos, como por exemplo, a ação das bombas de elevação, a adesão de um pedaço de mármore molhado a outro, a ação de um fole, a impossibilidade de se fazer um “buraco” num líquido como se faz num sólido, e assim por adiante” (CONANT, 1947, p.55).

O «vácuo» relativo é que não pode continuar a ter tal nome porque o vazio é vão e o nada...de nada serve e a natureza onde “nada se perde, nada se cria do nada, mas onde tudo se transforma” tem “horror ao vazio” onde até andar, apenas de passagem como a luz tem andado, é perigoso, doentio e solitário demais para ser sensato continuar a deixar que a relatividade geral ande a gerar quimeras e monstruosidades como os buracos negros e a expansão acelerada do universo e outras singularidade míticas e por vezes tão místicas como o Big-Bang!

Seja como for, começa a ser evidente que antes das bombas de vácuo era difícil a ciência do vazio molecular tal como antes da luneta de Galileu era prematuro imaginar o céu como da mesma natureza da terra. De qualquer modo, a teoria do “horror ao vácuo” era tão engenhosa quanto a do “estado natural”: respondia às questões que a levantavam sem, apesar disso, não dizer nada...exactamente como a tese newtoniana da atracção gravítica! O que está errado na teoria de Aristóteles não é tanto a teoria, que até funciona, mas a linguagem que nela usa o pressuposto finalista que reporta apetites à natureza que os perdeu por pressuposto racionalista decorrentes dum paternalismo olímpico de “natureza morta” e de um humanismo helenístico onde o homem foi deixado sozinho com o livre arbítrio porque a velha deusa mãe Ananque passou a ser a deusa primordial da inevitabilidade entrelaçada a Cronos, o deus do tempo, equivalente de Enki, no laço dum par de cobras atado ao caduceu desde o início dos tempos e em que ambos, Ana + Enki, a mãe Natureza e o seu filho primogénito, eram as forças cósmicas eternas do Destino e do Tempo. Mas, se a atracão da gravidade não é um apetite contra natura é uma estranha e louca paixão com atracções fatais entre massas cósmicas de tal modo inevitável que a esta hora todo o universo deveria ser um buraco negro infinitesimal.

Vejamos como Hegel encara este “sentimento metafísico” da matéria.

NOTA 2: Nesta forma de existência, o uno é o grau da categoria que entre os antigos fez a sua estreia como o princípio do atomismo, de acordo com qual a essência das coisas são: o átomo e o vazio (rό άτομον o bien rά άroμa kaί rό κενόν). Quando desenvolvida desta forma, a abstração ganhou uma maior determinação do que o ser de Parménides e o devir de Heráclito. Tão alto quanto esta abstracção se levanta ao fazer estasimples determinação do uno e do vazio como princípio de todas as coisas, reduzindo a variedade do mundo a esta simples oposição e ousar derivar o conhecimento disto do último, tão fácil é para a reflexão figurativa imaginar átomos aqui e o vazio ao lado deles. Não é portanto, surpreendente, que o princípio atomístico se tenha preservado em todas as épocas; igualmente a relação trivial e externa da composição, que ainda lhe deve ser adicionada para atingir a aparência de unidade concreta e de uma multiplicidade, é tão popular quanto os próprios átomos e o vazio. O uno e o vazio são o ser-para-si, o ser-dentro-de-si qualitativo mais elevado, caído na completa exterioridade; a imediação ou o ser de uno, por se tratar da negação de todo ser-outro, se encontra posta para não ser mais determinável ou mutável; e por seu absoluto rigor toda a determinação, multiplicidade e conexão permanece, portanto, uma relação absolutamente externa.

213 - Com os primeiros pensadores, no entanto, o princípio atomístico não permaneceu nessa exterioridade, mas também tinha, além de sua abstracção. No entanto, entre os primeiros pensadores que o conceberam, o princípio atomístico não permaneceu em tal exterioridade, mas pelo contrário tinha, além de sua abstracção, uma determinação especulativa nisto: que o vazio fosse reconhecido como a fonte do movimento; o que constitui uma relação entre os átomos e o vazio completamente diferente do seu ser puro próximo um do outro e da indiferença dessas duas determinações uma contra a outra.

Que o vazio é a fonte do movimento não tem o significado trivial que algo só pode se mover em um espaço vazio e não em um já ocupava pelo uno, pois no último não encontraria espaço deixado aberto; entendido dessa maneira, o vazio seria apenas o pressuposto ou a condição de movimento, não o seu solo, e o próprio movimento seria pressuposto como já existe enquanto o ponto essencial, o seu fundamento, é esquecido. A visão de que o vazio constitui o fundamento do movimento contém o pensamento mais profundo de que o terreno do devir, do agitação e auto-movimento, encontra-se no negativo em geral, que, neste sentido, no entanto, deve ser tomado como a verdadeira negatividade do infinito. - O vazio é o fundamento do movimento apenas como a referência negativa do uno para com o seu negativo, para o uno, isto é, para o seu próprio eu colocado, no entanto, como determinado existente.

Mas, por outro lado, as últimas determinações dos antigos com respeito à forma e posição dos átomos e à direcção de seu movimento são arbitrárias e externas e também estão em contradição directa com a determinação fundamental dos átomos. Os átomos, princípio da máxima exterioridade e, portanto, da máxima falta de conceito, afectam [desfavoravelmente] a física na teoria das moléculas e das partículas, assim como a ciência política, que tem como ponto de partida a vontade particular dos indivíduos.

C. Muitos unos – Repulsão: O uno e o vazio constituem a primeira existência do ser-para-si. Cada um destes momentos tem negação para sua determinação, e está posicionado ao mesmo tempo que uma existência. De acordo com essa determinação, a que e o vazio são, cada um, a referência da negação à negação como de outra para o outro: o uno é a negação na determinação do ser; o vazio, negação na determinação do não-ser. Essencialmente, no entanto, aquele é apenas auto-referência como negação referente, isto é, é ela mesma a mesma que a vazio do lado de fora é suposto ser. Ambos são, no entanto, também postulados como cada existência afirmativa - um como sendo para si como tal, o outro como existência indeterminada em geral - e cada um como referindo-se ao outro como para uma outra existência. Essencialmente, no entanto, o ser-para-si daquele é a idealidade da existência e do outro; não se refere a um outro, mas apenas para si mesmo. Mas na medida em que o ser-para-si é fixo como o um, como existente por si mesmo, como imediatamente presente, sua referência negativa a si mesmo é ao mesmo tempo referência a um existente; e desde a referência é tão negativo quanto aquele a que o ser-para-si refere determinado como uma existência e como outro; como essencialmente auto-referência, o outro não é negação indeterminada como o vazio, mas é igualmente um. O uno é, consequentemente, um devir de muitos. Estritamente falando, porém, isso não é apenas um devir; para se tornar é uma passagem de estar em nada; o outro, pelo contrário, torna-se apenas um referido, como referido, contém o negativo como referência; tem essa referência, portanto, nele. Assim, em vez de um devir, a próprio referência imanente é, em primeiro lugar, presente; e, segundo, como essa referência é negativo e um é ao mesmo tempo um existente, o que se repele de si mesmo. Esta referência negativa do um para si é a repulsão. (...)

NOTA 5: Atração e repulsão, como é bem conhecido, são geralmente consideradas como forças. Devemos agora comparar essa determinação deles, e as relações conectada com isso, da maneira como acabamos de concebê-los. - Considerado como forças, elas são tratadas como autónomas e, portanto, não se referem a uns aos outros por natureza, isto é, não como cada um apenas um momento que deve passar para o seu oposto, mas como cada um persistindo em oposição ao de outros. Eles estão representados, além disso, como se juntando em um terceiro, na matéria - de tal maneira, no entanto, que esta unificação não conta como sua verdade, mas cada um conta antes como um primeiro, como um existente em si e para si: é matéria ou determinações da matéria que são postuladas e produzidas através de eles.

Quando se diz que a matéria tem forças dentro de si, então ela é entendida sob essa unidade de sua conexão, onde elas são vistas pressupostas como existindo dentro de si mesmas e livres umas das outras. – A Ciência da Lógica, Georg Wilhelm Friedrich Hegel.

Mais estranho ainda é pensar com Hegel que o vazio, mais do que uma condição para a penetrabilidade do movimento na realidade natural, seja “o fundamento do movimento apenas como a referência negativa do uno para o seu negativo, para o uno, isto é, para o seu próprio eu colocado, no entanto, como determinado existente”. Entendido? Duvida-se mas adiante[3]!

Ora, se de facto a Natureza (atomística, corpuscular ou como tal se comportando) “abomina o vazio” porque tende a preenche-lo assim que pode, ou seja, porta-se como se de facto lhe aborrecesse manter locais sem utilidade, é duvidoso que a mesma Natureza seja capaz de sentir estes sentimentos tal como é inaceitável que possa sentir atracção física por outros corpos que seria capaz de detectar a distâncias infinitas! No entanto, Arthur Schopenhauer em «O Mundo como vontade e representação» refere: Se, pois, eu disser que a força que atrai a pedra para a terra é, conforme sua essência em si, além de representação, vontade -- que não se atribua a tal frase a tola opinião de que a pedra se movimenta segundo um motivo conhecido, já que é assim que a vontade aparece no homem e depois em nota*: De modo algum concordamos com Bacon de Verulam, quando (De augm. Scicnt. L 4 in fine) opina que rodos os movimentos físicos e mecânicos dos corpos só se seguem depois de uma percepção prévia nesses corpos; embora um pressentimento da verdade envolva essas falsas colocações. O mesmo ocorre com a afirmação de Kepler, em seu ensaio De planeta Martis, de que os planetas têm de possuir conhecimento para se manterem tão exactamente em sua órbita elíptica e assim avaliarem a velocidade de seu movimento, de modo que o triângulo da área de sua órbita sempre permanece proporcional ao tempo no qual passam por sua base.

E, de seguida, Arthur Schopenhauer deveria ter introduzido a distinção entre determinismo e livre arbítrio para distinguir a diferença entre a necessidade da natureza e a vontade mas obviamente que ao nível da coisa em si é impossível saber se existe diferença entre o fenómeno da vontade humana estudados pela psicologia e os restantes fenómenos estudados pela ciência natural embora se aceite que participam da mesma realidade objectiva ressalvadas as respectivas distâncias de complexidade e subjectividade.

No caso de um fole comum, por exemplo, o ar entra violentamente depois de se diminuir dentro dele a pressão porque os seus constituintes elementares (moléculas) por um lado são empurradas pela pressão atmosférica e por outro caem no vácuo do fole expandido porque perderam subitamente o apoio desse lado da entrada do ar, ou seja actuam sobre elas tanto forças de atracão como de repulsão o que microscopicamente resultará em vórtices e não em movimentos lineares regulares e uniformes.

O que é que efectivamente gera o movimento de entrada de ar no pulmão? Obviamente que as duas causas do movimento (atracão e repulsão), porque a pressão só por si não levaria a nada se não houvesse uma descompressão dentro do tórax e estas duas causas resumem-se a uma só unidade de pensamento: um desequilíbrio de momentos de apoio (molecular ou outro) no espaço gerado pelo “vazio relativo” dentro do mediastino, mais precisamente por diminuição da pressão dos componentes moleculares do seu conteúdo. Se tal significa, que “a matéria tem essas duas forças (atração e repulsão) em si mesma” e se“essa unidade que têm na matéria é entendida como uma associação dentro da qual são ao mesmo tempo pressupostos de permanecerem independentes e livres umas das outras” eis, quod era demonstrandum, ou seja que as coisas atraem o que lhe falta para existirem e repelem os que lhes limita e determina a existência. Põe isso é que, em equilíbrio dinâmico, o movimento molecular é aleatório e brauneanao e também é por isso que sem fluxos dinâmicos que o determinem nenhum corpo sai do seu equilíbrio dinâmico estável para se lançar nos braços da aventura das forças cósmicas. O Devir acontecem por atracção do Ser e repulsão do não ser Nada porque podem acontecer ou seja, passando da potência ao acto.

Este mundo: uma monstruosidade de força, sem princípio, sem fim, uma firme, brônzea grandeza de força... uma economia sem despesas e perdas, mas também sem acréscimos, ou rendimento,...mas antes como força ao mesmo tempo um e múltiplo,...eternamente mudando, eternamente recorrentes... partindo do mais simples ao mais múltiplo, do quieto, mais rígido, mais frio, ao mais ardente, mais selvagem, mais contraditório consigo mesmo, e depois outra vez...esse meu mundo dionisíaco do eternamente-criar-a-si-próprio, do eternamente-destruir-a-si-próprio, sem alvo, sem vontade...Esse mundo é a vontade de potência — e nada além disso! E também vós próprios sois essa vontade de potência — e nada além disso!” Nietzsche, 1885.

 

A VIDA

O instinto sexual demonstra, além disso, ser a mais positiva e mais enérgica afirmação do querer-viver, porque constituiu para o homem, no estado de natureza, como para o animal, o último escopo e o supremo resultado da vida. A primeira tendência do indivíduo é a conservação de si; apenas tenha provido a tal, não aspira senão a propagar a espécie; como criatura natural não pode ter, para além, outra tendência. Também a natureza, da qual é essência íntima o querer-viver, atira com todas as suas forças, tanto o homem quanto o animal, à reprodução. Depois do que, quando obteve do indivíduo o resultado que dele esperava, torna-se absolutamente indiferente à sua destruição; porquanto na sua qualidade de querer-viver, interessa-se unicamente pela conservação da espécie, e nunca pelo indivíduo. (...)

No livro segundo depreendemos que necessarimente existe em toda a natureza, em todos os graus de objetivação da vontade, uma luta incessante entre os indivíduos das várias espécies, e que com isto se revela um antagonismo interno do querer-viver consigo mesmo. No grau supremo de objetivação, tal fenómeno, como tudo o mais, se manifestará com clareza muito maior e poderá ser interpretado mais completamente. Com esse fim procuremos antes de tudo a origem do egoísmo, que é o ponto de partida de toda luta. -- O MUNDO COMO VONTADE E REPRESENTAÇÃO, Livro IV, Arthur Schopenhauer.

 

O essencial dessa visão é antigo: Heráclito lamentava nela o fluxo eterno das coisas; Platão desvalorizava seu objeto como aquilo que sempre vem-a-ser, sem nunca ser; Espinosa o nomeou meros acidentes da substância única, existente e permanente; Kant contrapôs o assim conhecido, como mero fenômeno, à coisa-em-si, por fim, a sabedoria milenar dos indianos diz: “Trata-se de MAIA, o véu da ilusão, que envolve os olhos dos mortais, deixando-lhes ver um mundo do qual não se pode falar que é nem não é, pois assemelha-se ao sonho, ou ao reflexo do sol sobre areia tomado a distância pelo andarilho como água, ou ao pedaço de corda no chão que ele toma como serpente”. -- SCHOPENHAUER, Arthur. O mundo como vontade e como representação. Tradução: Jair Barboza. São Paulo:UNESP, 2005, p. 44.

“Por isso denominamos o mundo fenomênico seu espelho, sua objetidade; e, como o que a Vontade sempre quer é a vida, precisamente porque esta nada é senão a exposição daquele querer para a representação, é indiferente e tão-somente um pleonasmo se, em vez de simplesmente dizermos “a Vontade”, dizermos “a Vontade de viver”’. (SCHOPENHAUER, 2005, p. 357-358).

No entanto, a vontade subjectiva de existir sentida como busca territorial de poder vital é no homem o que Espinoza deduzia "Toda a coisa, enquanto é em si, esforça-se por perseverar no seu ser." (E III, p6).

Este esforço de auto-preservação, ou conatus, pertence à natureza intrínseca de todas as coisas individuais, já que nenhuma delas contém o princípio da própria dissolução (sob pena, de contradizer a própria essência) e pode portanto ser destruída apenas por causas externas. Este conatus, esta vontade de manter ou aumentar o nosso poder de perseverar na nossa existência, é o fundamento dos juízos morais que aplicamos às coisas: Espinoza afirma a neutralidade moral da natureza, que é dominada por uma necessidade totalmente cega que a coloca para além dos valores; ele acredita, porém, que em virtude do nosso impulso de sobrevivência, naturalmente desejamos o que favorece a nossa conservação e recusamos o que a ameaça, e que, portanto, «não apetecemos nem desejamos qualquer coisa porque a consideramos boa; mas, ao contrário, julgamos que uma coisa é boa porque tendemos para ela, porque a queremos, a apetecemos e desejamos

Então, a única razão que nos permite acreditar na subsistência eterna do Universo é a suspeita de que sendo infinitamente inexorável a sua entropia material, tendencialmente caótica, também a negantropia formal e organizativa da ordem vital terá que ser infinita, mantendo-se assim o equilíbrio total entre o acaso da desordem e a necessidade organizativa de todos os processos envolvidos no Devir. Sendo assim, o princípio mais geral e universal da conservação não é o da Matéria / Energia mas o da Substância do Ser de que depende a eternidade e a infinita conservação do Universo sendo a natureza do movimento uma crença na dualidade dos processos opostos e divergentes que o compõem, feita de equilíbrios sistémicos abertos porque o caos que a criação organizativa gera segundo o segundo princípio da termodinâmica são o substrato de novas forma de criações a múltiplos e infinitos níveis de organização e de vida que no final se revela como sendo o terceiro principio em falta na termodinâmica para que o principio de Lavoisier volte a ser válido.

Los sistemas vivos son capaces de conservar estados de organización improbables (entropía). Este fenómeno aparentemente contradictorio se explica porque los sistemas abiertos pueden importar energía extra para mantener sus estados estables de organización e incluso desarrollar niveles más altos de improbabilidad. La negentropía, entonces, se refiere a la energía que el sistema importa del ambiente para mantener su organización y sobrevivir (Johannsen. 1975).

Ao princípio entrópico da morte térmica opõe-se o princípio sintrópico (negantrópico) da organização sistémica que retoma o princípio criador do elan vital de Bergson a um nível muito mais universal e cósmico.

Na investigação filosófica sobre a mente, a expressão elã vital é uma expressão de origem francesa (élan vital) que foi utilizada por Henri Bergson (1859-1941) para designar um impulso original de criação de onde proviria a vida e que, no desenrolar do processo evolutivo, inventaria formas de complexidade crescente até chegar, no animal, ao instinto e, no homem, à intuição, que seria o próprio instinto tomando consciência de si mesmo.

Uma física que foi delongadamente separada das ciências naturais teria que redundar na morte térmica inexorável do universo que só a força essencial do elã vital da sintropia, inerente à substância do Ser, poderão manter na eternidade da existência. Ora bem, dizer que a entropia é proporcional à negantropia do Universo a todas as escalas do espaço e do tempo equivale a dizer que afinal e existência não passa de uma ilusão do Ser.

Na verdade, se as ciências naturais comprovam que omnis cellula ex cellula, temos que generalizar com mais propriedade ainda que “a vida nasce da vida” (por generalização indutiva de todas as vidas passadas e anteriores) do mesmo modo que o mais complexo e organizado nasce do mais simples e aparentemente organizado de acordo com a nossa escala de observação. Dito de outro modo, o princípio da conservação do Ser como substância imutável de Tudo e do Todo implica o princípio mais geral de conservação do ser admitindo que o caos e a organização obedecem à regra da acção e reacção sendo o verso e reverso do mesmo processo do Devir. Na prática tal implica a aceitação de que as perdas invisíveis de energia são absorvidas por processos invisíveis do seu reaproveitamento em formas invisíveis de criação de matéria oculta, porque “na natureza nada se perde nada se cria e tudo se transforma” e ao lado de cada destruição e desperdício aparece vida e organização que reaproveitam a sua energia remanescente ad nausem e ad infinitum. Na verdade, se repararmos bem, a termodinâmica não determina o aniquilamento da energia em si mesma mas a sua dispersão enquanto fonte de energia útil, humanamente aproveitável e disponível. Mesmo as físicas que prevêem a destruição da matéria, em confronto hegeliano com a antimatéria, se postula que esta se transforma em energia do vazio. É certo que os estados com baixa entropia são inerentemente improváveis, tal como a vida o é, de tal modo que só a encontramos até agora na Terra mas a eternidade infinita tem tempo para tudo!

Vejamos o exemplo que usa Julian Barbour:

Se colocarmos um cubo de gelo dentro de uma caixa, a entropia aumentará da seguinte forma: primeiro teremos um cubo bem ordenado, ou seja, com baixa entropia.

Então aquele cubo derreterá e a água se espalhará pela caixa. A entropia aumentará. Finalmente, a água poderá evaporar, e suas partículas se distribuiriam indistintamente por toda a caixa. A entropia atingirá seu nível máximo.

Em um espaço sem limites, diz Barbour, essas partículas de água poderiam continuar viajando e, graças à gravidade, se juntar a outras partículas até formarem estruturas novas e mais complexas, que se expandiriam em todas as direções do espaço... e do tempo.

Assim, segundo Julian Barbour, o que determina a passagem do tempo não é o aumento da entropia, mas o aumento da complexidade, sem limites de tempo ou espaço.

Na visão tradicional da física, a entropia aumenta implacavelmente com o passar do tempo, o que significa que um dia nosso Universo atingirá seu estado máximo de entropia: terá se expandido tanto que será uma desordem total. Ou, melhor, dizendo uma infinidade de nulidades solitárias!

Julian Barbour, porém, arrisca-se com uma visão mais optimista. Em sua teoria, o tempo não avança inevitavelmente em direção à entropia total. O que ele prevê é o inverso: um Universo cada vez mais complexo e estruturado que cresce sem fronteiras. Na verdade, em vez de dissipação, Barbour prefere dizer que a energia se espalha. (...)

Sua visão é a de um Universo cada vez mais variado e dinâmico, onde não faltará calor e energia para continuar crescendo em todas as direcções do tempo e do espaço[4].

E na verdade não falta energia no Universo porque ela, a energia é a sua essência, do mesmo modo que a matéria é a sua existência tal como o Ser é a substância de tudo.

O mesmo Julian Barbour afirma que Mach observou

Está totalmente além de nosso poder medir as mudanças das coisas pelo tempo. Muito pelo contrário, o tempo é uma abstração à qual chegamos através das mudanças das coisas.”

Assim, o tempo como tal não existe, apenas muda. Grande parte da minha pesquisa foi dedicada às implicações desse insight. Mostrei como, ao lado da relatividade do movimento, a noção de tempo como mudança pode ser construída nas bases da dinâmica. Na verdade, essa ideia está contida de uma forma oculta na relatividade geral. Suas consequências potenciais para a ainda não descoberta mecânica quântica do universo são profundas. O universo quântico provavelmente é estático. O movimento e a aparente passagem do tempo podem ser apenas ilusões muito bem fundadas. (...)

Mas a unificação da relatividade geral e da mecânica quântica pode muito bem significar o fim dos tempos. Com isso, quero dizer que ela deixará de ter um papel nos fundamentos da física. Veremos que o tempo não existe.

No entanto é difícil seguir Julian Barbour quando esta afirma: Agora acho que devemos, em uma virada irónica para a revolução copernicana, ir mais longe, para uma realidade mais profunda em que nada, nem o céu nem a Terra, se movem.

Como sabemos esta era a posição dos eleatas ou seja o que Julian Barbour propõe é um regresso ao cepticismo idealista antigo que contaminou o próprio paradoxo socrático: «só sei que nada sei». Na verdade, o tempo é seguramente uma abstracção cuja materialização é a fonte de todos os equívocos relativistas pós einsteinianos e o movimento poderá ser uma ilusão relativa à sucessão de diferentes instantes e «agoras» mediado pelos suportes de memória e pur si muove algo, aqui e agora!

 O TEMPO E A MUDANÇA
A definição do movimento de Descartes não diverge em quase nada da de Aristóteles o que comprova que a questão fundamental entre os modernos e Aristóteles era mais de preconceito do que de metafísica.
El físico tiene que estudiar el lugar de la misma manera que el infinito, a saber: si es o no es, de qué modo es, y qué es. Porque todos admiten que las cosas están en algún «donde» (...), y porque el movimiento más común y principal, aquel que llamamos «desplazamiento», es un movimiento con respecto al lugar.  Aristóteles – Física.
Tendo em vista que Descartes compreende o movimento “simplesmente” como “mudança de lugar”, como pode haver movimento sem vazio, se o movimento é entendido tão somente como o que faz os corpos passarem de um lugar para outro? (…)
Considero que há uma infinidade de diferentes movimentos que duram perpetuamente no mundo. E, após ter observado os maiores, que constituem os dias, os meses e os anos, noto que os vapores da terra não cessam de subir em direção às nuvens e de lá descer, que o ar está sempre agitado pelos ventos, que o mar jamais está em repouso, que as fontes e os rios fluem sem cessar, que os mais firmes edifícios por fim entram em decadência, que as plantas e os animais não fazem mais que crescer ou se corromper, em suma, que não há nada, em lugar algum, que não se altere (AT XI, p. 10-11; DESCARTES, 2009, p. 29-31). – O PAPEL DO MOVIMENTO N’O MUNDO DE DESCARTES, Marcos Alexandre Borges.
Lo mismo hay que decir del supuesto de que las cosas son así por la Naturaleza y que ésta ha de ser considerada como un principio, como parece haber pensado Empédocles cuando dice que el dominio y la fuerza motriz alternante del Amor y el Odio es algo que pertenece por necesidad a las cosas, y que en el tiempo intermedio las cosas están en reposo. (...)
Baste, pues, con lo dicho para mostrar que nunca hubo un tiempo en el que no hubiera movimiento y que nunca habrá un tiempo en el que no haya movimiento. -- Aristóteles – Física.
É interessante que este princípio do moto perpetuum seja sobretudo da intuição subjectiva e emocional porque aparece num dos mais belos sonetos da lírica camoniana sobre as vicissitudes que nem só já da vida amorosa mas da existência em geral.
Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades,
Muda-se o ser, muda-se a confiança:
Todo o mundo é composto de mudança,
Tomando sempre novas qualidades.
Continuamente vemos novidades,
Diferentes em tudo da esperança:
Do mal ficam as mágoas na lembrança,
E do bem (se algum houve) as saudades.
O tempo cobre o chão de verde manto,
Que já coberto foi de neve fria,
E em mim converte em choro o doce canto.
E afora este mudar-se cada dia,
Outra mudança faz de mor espanto,
Que não se muda já como soía. -- Luís Vaz de Camões, in "Sonetos"
O tema da mudança como realidade sobretudo emocional é muito recorrente na Renascença e sempre para pior tanto em Camões como em Sá de Miranda.
Ó cousas, todas vãs, todas mudaves,
Qual é tal coração que em vós confia?
Passam os tempos, vai dia trás dia,
Incertos muito mais que ao vento as naves.
                                                    Sá de Miranda.
Mas é óbvio que o progresso científico demandava uma cada vez mais clara objectividade que passava tanto pela separação da física da metafísica como da visão mítica e poética do mundo!
O cinema hoje é tido como movimento. Mas o movimento não existe. O que existe são as coisas a moverem-se no espaço. -- Manoel de Oliveira. "A vida é uma derrota"[1]
Nesta melhoria da visão do mundo a bordo das naus dos descobrimentos marítimos os ibéricos acabavam demonstrando os erros dos antigos ao dar novos mundos ao mundo e comprovando urbi et orbi a rotundidade da Terra com a viagem de circum-navegação de Fernão de Magalhães.
Estimulados por essas teorias, vários países e vários grupos de comerciantes europeus lançam-se ao mar, buscando apoio na ciência para ampliar seus conhecimentos sobre construção naval e sobre as rotas marítimas de comércio. A Terra é mapeada e esquadrinhada por geômetras e cientistas; os comerciantes, com uma atitude típica da época - o experimentalismo -, põem em prática as teorias científicas, navegando. A descoberta da América por Colombo (1492), por exemplo, e a primeira viagem ao redor do mundo (1519-1521), realizada por Fernão de Magalhães, são atitudes ousadas de navegantes que acreditavam na rotundidade da Terra muito antes de sua comprovação. -- [2]
«Que direi daqueles — diz Lactando — os quais tiveram para si que há no Mundo outros homens que andam com os pés virados para nós, a que chamam antípodas? Porventura dizem estes alguma cousa que tenha fundamento, ou pode haver homem de tão pouco juízo que se lhe meta na cabeça que há homens que andem com a cabeça para baixo, e que todas as cousas que aqui estão em pé, e direitas, lá estejam dependuradas? Que as árvores cresçam para a parte inferior? Que a chuva caia para cima? (...)
Mas será bem que digamos a origem donde teve princípio este erro e que razão moveu ou levou estes homens a uma cousa tão irracional, como haver antípodas. Viam que o Sol, a Lua e estrelas, saíam sempre do Oriente e entravam pelo Ocaso; viam, ou cuidavam que viam, que este céu que nos cobre, tem figura de uma abóbada (sendo que esta representação não a faz a figura do céu, senão o termo e fraqueza de nossa vista); e não entendendo o modo por que esta máquina se governa, vieram a imaginar que o Mundo era redondo como uma bola, e assim fingiam que havia no céu vários orbes de matéria sólida como bronze, em que estavam esculpidas essas imagens e corpos portentosos, a que chamamos estrelas e planetas. Desta redondeza ou rotundidade do céu inferiam e assentavam que também a Terra era redonda; e, acomodando-se naturalmente a figura do corpo exterior e maior, dentro do qual estava metida, e torneada desta maneira, e feita redonda a Terra, tiravam por segunda consequência que também havia de estar povoada de homens e de animais, em todas as partes, como está: nesta em que vivemos; assim que a imaginada rotundidade do céu foi a inventora destes antípodas pendurados. (...).
O que se haja de dizer de tais homens e de tais entendimentos, não o sei; só digo que, depois de terem caído no primeiro erro, perseveram constantemente na sua ignorância, defendendo umas cousas vãs com outras tão vãs como elas; sendo que algumas vezes cuido que não dizem nem escrevem isto de siso, senão por jogo e zombaria, e que sabendo muito bem que tudo o que dizem são fábulas e mentiras, as defendem contudo para ostentar habilidade e engenho, empregando tão bons entendimentos em tão más cousas. Este é o discurso de Lactâncio, e foi bem que o deixasse tão miúdamente escrito, para que soubéssemos o que naquele tempo se sabia do Mundo e para que saiba o mesmo Mundo quanto deve aos Portugueses, primeiros descobridores de seus antípodas. (...)
«E quanto à fábula dos que fingem que há antípodas — diz Santo Agostinho, isto é, homens da outra parte do Mundo, onde o Sol lhes nasce a eles, quando se põe a nós, e que pisam a terra com os pés voltados para os nossos, como nós para os seus, é cousa que de nenhum modo se há-de crer, nem seus autores o provam com alguma história que tal afirme, e só o conjeturam por discursos.
Não dissera isto o sapientíssimo Doutor, se já naquele tempo estiveram escritas as histórias dos Portugueses, mas este é o maior louvor da nossa Nação (como disse um orador delas) que chegaram os Portugueses com a espada onde Santo Agostinho não chegou com o entendimento. -- Padre António Vieira HISTÓRIA DO FUTURO, CAPÍTUL0 XII.
O problema com Descartes é saber o que é a substância do ser depois de se aceitar o movimento eterno como determinante da sua realidade.
O que faz com que haja movimento no mundo físico, segundo Descartes, não é algum motor (seja ele primeiro ou não), mas é a simples presença de movimento. Se não há vazio e há movimento, não é possível que o movimento não seja constante, não é possível que o movimento de alguns corpos não cause o movimento de outros e não determine todas as configurações dos corpos (figura, tamanho, etc.). (…)
Portanto, segundo a física cartesiana é possível que os corpos passem de um lugar para outro e ocupem sucessivamente todos os espaços que há entre eles, sem a necessidade do vazio, por conta da existência de diferentes elementos na natureza. Sendo que os elementos mais líquidos, formados por partículas muitíssimo pequenas de matéria e que se movem muito rapidamente, não são perceptíveis aos sentidos e são facilmente removíveis pela acção de corpos mais sólidos. E os espaços em que não se percebe a presença de algo, o que faz com que se pense no vazio, estão ocupados por esses elementos muito sutis e imperceptíveis à limitada capacidade de percepção humana. – O PAPEL DO MOVIMENTO N’O MUNDO DE DESCARTES, Marcos Alexandre Borges.
Como a Substância é o que permanece nas coisas que mudam e, portanto, o fundamento de todo o acidente que designa as determinações que podem mudar, Descartes definiu-a como sendo tudo aquilo que não necessita de nenhuma outra cosa para existir o que costuma ser definido como sendo o Absoluto, aspecto que reportado à Natureza iria colocar Descartes na posição de uma panteísta discípulo de Espinosa.
Por Isso temos razão quando na Escola dizemos que o nome de substância não é unívoco relativamente a Deus e às criaturas, isto é, não concebemos distintamente nenhuma significação desta palavra que convenha a ambos com o mesmo sentido. [Mas porque entre as coisas criadas algumas são de tal natureza que não podem existir sem outras, distinguimo-las daquelas que só têm necessidade do concurso ordinário de Deus, chamando então substâncias a estas, e qualidades ou atributos das substâncias àquelas].
“De l’étendue maintenant telle que la conçoit Descartes, c’est-à-dire comme une masse au repos, il n’est pas seulement difficile, ainsi que vous le dites, mais complètement impossible de tirer par démonstration l’existence des corps. La matière au repos, en effet, persévérera dans son repos autant qu’il est en elle et ne sera mise en mouvement que par une cause extérieure plus puissante. Pour cette raison je n’ai pas craint d’affirmer jadis que les principes des choses de la nature admis par Descartes sont inutiles, pour ne pas dire absurdes.“ (Lettre 81, 1676). Spinoza à Ehrenfried Walther von Tschirnhaus.
Tout d’abord, c’est Spinoza lui-même qui réfute catégoriquement - quelques móis avant sa mort - dans sa lettre 81 à Ehrenfried Walther von Tschirnhaus (1651-1708) la façon dont Descartes conçoit l’étendue comme «masse en repos» ou autrement dit matière dépourvue de mouvement. (...) Selon Spinoza, un corps est un ensemble três dynamique des corps composants identifié par un rapport mutuel de mouvement et de repôs [motus et quietis rationem]. Presque tout peut varier: la grandeur des parties peut varier, la vitesse et la direction de la vitesse peuvent changer, les parties peuvent être séparées et substituées et le corps en soi peut même être en repos ou en mouvement dans n’importe quelle direction. Toutefois, le corps maintient sa nature à condition que son ratio de repos et de mouvement soit identique. Un corps n’est donc pas quelque chose qui peut AVOIR un mouvement ou un repos par rapport aux corps voisins, mais plutôt une individualité physique qui EST un ensemble de « mouvement et repos » des parties. -- Le « démasquement » de Descartes par Spinoza dans les Principia Philosophiae Cartesianae, F.F.A. Buyse Université Paris 1- Panthéon / Sorbonne.
Obviamente que com a substância de Descartes a física teórica não teria ido muito longe porque o único referencial seria o absoluto que só poderia ser Deus que estando em toda a parte também não está em parte alguma. Como é óbvio, esta questão é eminentemente metafísica e discuti-la irá lentamente perder sentido em detrimento da objectividade que em Descartes estaria, afinal, apenas nos «elementos», razão pela qual o racionalismo de Descartes acabou alcunhado de materialista.
Simplício da Cilícia, em seu livro Física, assim nos explica sobre a natureza desse Ser-Absoluto de Parmênides: “Como poderia ser gerado? E como poderia perecer depois disso? Assim a geração se extingue e a destruição é impensável. Também não é divisível, pois que é homogéneo, nem é mais aqui e menos além, o que lhe impediria a coesão, mas tudo está cheio do que é. Por isso, é todo contínuo; pois o que é adere intimamente ao que é. Mas, imobilizado nos limites de cadeias potentes, é sem princípio ou fim, uma vez que a geração e a destruição foram afastadas, repelidas pela convicção verdadeira. É o mesmo, que permanece no mesmo e em si repousa, ficando assim firme no seu lugar. Pois a forte Necessidade o retém nos liames dos limites que de cada lado o encerra, porque não é lícito ao que é ser ilimitado; pois de nada necessita – se assim não fosse, de tudo careceria. Mas uma vez que tem um limite extremo, está completo de todos os lados; à maneira da massa de uma esfera bem rotunda, em equilíbrio a partir do centro, em todas as direcções; pois não pode ser algo mais aqui e algo menos ali.” – Parmênides – Wikipédia, a enciclopédia livre
O princípio da conservação da energia manifestava-se na física cartesiana na conservação da quantidade de movimento porque afinal era apenas ele o que permanecia durante a mudança...o que parece ser uma contradição nos termos que vamos encontrar em Aristóteles, se é que isso pode ser possível como as polémicas dos eleatas e pré-socráticos o demonstraram.
O antigo sistema filosófico dos eleatas só admitia duas espécies de conhecimentos: os que provinham dos sentidos e eram meras ilusões, e os que provêm do raciocínio e são os únicos verdadeiros, ou seja, contrapunham ao empirismo o racionalismo que foi durante os séculos seguintes o grande travão ao desenvolvimento científico moderno. Na verdade, o pensamento moderno só irá progredir quando se começou a dar conta de que não existe empirismo descontrolado senão entre tolos e que a racionalidade inteiramente desligada da realidade sensível só gera especulações quiméricas, mitos e ficção científica. E Descartes, também racionalista, o diria se pudesse ser confrontado com Newton.
Este es un problema fundamental que a finales del siglo XVII enfrentará a los pensadores newtonianos – mejor dicho, al mismo Newton – con Leibniz, precisamente, por el problema de la conservación o no de la cantidad de movimiento que hay en el universo; de manera más exacta, si el movimiento se conserva o tiende a acabarse. Según Newton, la cantidad de movimiento en el universo tiende a acabarse, es decir, que tiende al reposo; esta es la razón por la cual Dios, de vez en cuando, interviene en él para imprimirle la cantidad de movimiento necesaria para que siga existiendo; por ello, según Leibniz, el Dios de Newton es un relojero que de vez en cuando debe darle cuerda el reloj para que siga funcionando, es por tanto, un Dios imperfecto.
De cierta manera, Leibniz es heredero del racionalismo cartesiano; así, defiende la idea de que Dios en el momento de la creación puso una cantidad de movimiento en el mundo que se mantiene constante y, por lo tanto, Dios no interviene en el mundo; es la razón por la que Newton, acusando de herejía a Leibniz, afirmaba que el Dios de Leibniz es un Dios holgazán, que creó el universo y el movimiento, y se acostó a dormir. -- LA FILOSOFÍA DE LA NATURALEZA CARTESIANA, por: Johman Carvajal Godoy.
O princípio de que a quantidade de movimento permanece constante já vinha de Heraclito que afirmava que “tudo é movimento, e que nada pode permanecer parado, excepto o próprio movimento”.

Que era então o movimento para os antigos?
Segundo Aristóteles, as coisas tendem a colocar-se no seu “lugar natural”, facto a que chamou de “movimento natural” com óbvia propriedade porque só artificialmente (por acção humana como seria miraculosamente por intervenção divina, se tal for epistemologicamente admissível) acontece algo na natureza de forma inabitual. Dois mil anos depois dizer isto pareceria pouco mais do que uma lapalissada se não fosse evidente que o difícil é saber qual é de facto o “local natural” das coisas no meio da complexidade caótica da realidade mediada pela fenomenologia dos caprichos da subjectividade humana.
Contudo, Aristóteles continuará por muitos séculos a ser uma dos maiores vultos do pensamento humano porque, não ignorando os limites da epistemologia que o platonismo do seu mestre lhe tinha ensinado e que os relativismos sofistas tornavam incontornável a tendência para aceitar que o “homem é a medida de todas as coisas”, ainda assim não desistiu de encontrar no realismo a verdade possível ao seu tempo, aceitando que ”nihil est in intellectu quod non fuerit prius in sensu[3]. Leibniz irá contrapor que “nada há na mente que não tivesse passado pelos sentidos...excepto a própria mente”...o que Aristóteles naturalmente não rejeitaria se as coisas lhe fossem assim colocadas no tempo do iluminismo!
Aristóteles resumiu o pensamento de todos os seus antecessores na sua teoria metafísica das quatro causas das quais os modernos respeitam apenas a material e a motora, sendo as restantes meras categorias formais mais ou menos arbitrárias.
Causa material de que resta a «matéria-prima»; a causa formal de que fica o essencial; a causa eficiente que fundamente ao determinismo e causa a final que resultaria no pragmatismo político se de boas intenções não estivesse o inferno cheio. Ainda assim, a causa final pode encontrar na física o peso da necessidade das leis naturais, ou seja, seria a forma tangível do lugar “natural das coisas” que como veremos é, de certo modo, o conceito mais simples de Aristóteles e também o mais bem conseguido, como adiante se verá.
Sobre a causa motora Aristóteles elaborou a física do movimento a que toda a substância está sujeita nas mudanças da sua matéria dividindo-o em acto e potência...ou seja, até o que não está em movimento participa potencialmente deste por lhe ser receptivo e poder vir a mover-se. Obviamente que tudo isto é apenas a descrição gramatical da realidade tal como ela se apresenta ainda hoje ao senso comum esclarecido particularmente no universo da prática jurídica.
Ahora bien, no hay movimiento fuera de las cosas, pues lo que cambia siempre cambia o sustancial o cuantitativamente; cualitativa o localmente, y, como hemos dicho, no hay nada que sea común a tales câmbios y no sea o un «esto» o una cantidad o una cualidad o alguna de las otras categorías. (...)
El movimiento es, pues, la actualidad de lo potencial, cuando al estar actualizándose opera no en cuanto a lo que es en sí mismo, sino en tanto que es movible. (...)
Es claro, entonces, que esto es el movimiento, y que una cosa se mueve cuando está en actualidad (...). Porque actuar sobre lo movible en cuanto tal es precisamente moverlo; pero el moviente hace esto por contacto, de tal manera que al mismo tiempo experimenta también una modificación. – Aristóteles – Física.
De facto, o pensamento de Aristóteles a respeito do movimento conseguiu ser mesmo mais subtil do que o de Descartes na medida em que distinguia o “movimento em geral”, de que o movimento subjectivo do pensamento faz parte, do “movimento local” que em particular era movimento objectivo e físico, ou seja, um mero aspecto formal do movimento real das coisas em acção e movimento.
No entanto, é forçoso dar conta de que o pensamento clássico (e quiçá o moderno) enferma muitas vezes de equívocos de linguagem ou então o grande Aristóteles também cometia gafes tremendas.
Dizer “pois o que muda sempre se altera nem que seja substancialmente” parece ser uma contradição nos termos sabendo-se que a substância é o que permanece durante a mudança...quiçá na convicção de Heráclito de que “tudo muda excepto a mudança”

”...quando deveria ter dito, sobretudo a mudança por ser mutável na sua essência e então até a substância do Ser é mutável por condição e essência! A verdade é que não sabemos muito bem o que dizemos quando pensamos as coisas desta maneira metafísica porque sendo o nosso espírito relativo e finito difícil lhe é pensar o Ser como infinitamente mutável sem perder a substancialidade una e indivisível. Quiçá a metafísica seja, como pensa Kant, inefável e indeterminada por essência e o movimento seja afinal uma forma de ilusão mas então é esta espécie de ilusão do nosso entendimento que constitui a nossa realidade sobre a qual nos cabe pensar e fazer ciência e o resto é pura metafísica de onde não saímos sem cair na loucura divina se nos enredamos à procura de uma teimosa descoberta do fio de Ariadne da verdade Absoluta. Por isso, o melhor é entender a metafísica como o conjunto de primeiros princípios recolhido à tona do oceano da indeterminação da especulação racional (e muitas vezes à toa) e sobre os quais nos entendemos o suficiente para construir uma epistemologia instrumental apta a fazer ciência útil e saber reconfortável.

 

 QUANTIDADE DE MOVIMENTO
Seja como for, parece que a última fronteira da condição mínima da realidade é a quantidade de movimento que já parecia estar latente no pensamento aristotélico. A física de Aristóteles era quase apenas uma gramática das ciências naturais do seu tempo, relativas ao entendimento que se pode ter do movimento que estando limitado aos conhecimentos do senso comum que não ia além do percurso pedestre ou por tracção animal, pois parece que o movimento de navegação não impressionou particularmente os clássicos. Aristóteles acaba a sua física com o apriorismo, hoje inaceitável, de que “somente o movimento circular pode ser contínuo e infinito” referindo-se seguramente, de forma implícita, ao mito do “eterno retorno” da Natureza, e ao movimento circular das esferas concêntricas dos astros na abóbada celeste, que segundo os gregos seria o movimento perfeito, eterno e regular porque, para todas as gerações, eram sempre observados os mesmos corpos celestes. Deste modo, Aristóteles transforma-se no primeiro teórico da física moderna e o último da nebulosa e mística física pré socrática que ainda tinha mais de mitologia do que de filosofia metafísica.
El tiempo y el movimiento son infinitos, y también el pensamiento, aunque no permanezca la parte que es tomada. (...)
Pero no hay ninguna necesidad de que exista el vacío por el hecho de que exista el movimiento. No hay en absoluto tal necesidad como condición de todo movimiento en general, por una razón que se le escapó a Meliso, a saber, porque lo lleno puede alterarse. Así, tampoco el movimiento local exige la existencia del vacío; porque los cuerpos pueden simultaneamente reemplazarse entre sí, sin que haya que suponer ninguna extensión separada y aparte de los cuerpos que están en movimiento. Y esto es evidente también en los torbellinos de los contínuos, como, por ejemplo, en los de los líquidos. – Aristóteles – Física.
A metafísica da causa motora de Aristóteles parecia ser tão clara que nem Descartes a alterou. Não foram alguns erros empíricos grosseiros de Aristóteles a respeito do movimento local quantitativo, como foi a necessidade da acção contínua, a perfeição e primazia do movimento circular e a diferença de velocidade na queda dos graves em função da densidade e Aristóteles poderia ser um cartesiano. Porém, Aristóteles era sobretudo um biólogo que estava longe do fôlego de Arquimedes em termos de observação física e deixou-nos uma física mais racionalista que realista porque quando a ciência se afasta da natureza, à míngua de dados sensíveis cai no excesso de racionalismo e à força de formalismos especulativos ou matemáticos acaba por gerar discursos incompreensíveis mais próximos da ficção científica do que da realidade.
A matemática é o instrumento científico utilizado para examinar o mundo do ponto de vista de sua quantidade, mas ela não é capaz de nos dar por si só a natureza do mundo. – Aristóteles.
Notar que Aristóteles não nega o valor da matemática. No entanto, Galileu irá retomar o erro do idealismo platónico ao referir metaforicamente que “a matemática é a linguagem da natureza” e Kant até irá mais tarde ao postular que estas duas ciências (a matemática e a física) eram capazes de elaborar "juízos sintéticos "a priori”, por tratarem justamente das leis que regem o conhecimento dispensando, assim, qualquer experiência. De facto, os progressos da física matemática do iluminismo foram tais que até Kant ficou rendido ao fascínio do casamento entre estas duas ciências que ocorreu depois de Galileu. No entanto, é inaceitável que Kant tenha confundido a Física com a Matemática no que repita aos "juízos sintéticos "a priori”. Se a “distinção dos objectos do conhecimento entre «fenómeno» e «núomeno» é basilar na teoria kantiana” porque o “objecto da experiência de nossas representações sensíveis e o objecto do entendimento de nossas representações intelectuais” são coisas diferentes então a física é distinta da matemática porque a primeira não sobrevive sem os «fenómeno» e a segunda só sobrevive com os «núomenos». Ora, quando a física dispensa os ‘juízos’ a posteriori” transforma-se numa ficção científica racionalista, como aconteceu com a física de Descartes.
“Por esta razão designaremos, doravante, por juízos a priori, não aqueles que não dependem desta ou daquela experiência, mas aqueles em que se verifica absoluta independência de toda e qualquer experiência”. (KANT, 2001, p. 37)
Ora bem, de facto a razão pela qual a filosofia nunca acaba por trazer convicções duradouras reside precisamente neste pequenos deslizes imperdoáveis que decorrem do facto de se usar o pensamento como um escravo da razão à maneira de um advogado do diabo. Uma ciência feita apenas de juízos a priori que fosse “absolutamente independente de toda e qualquer experiência” ou seria uma pura tautologia matemática ou uma ilusão teórica absoluta que nem a Física de Descartes foi.
Tomemos o exemplo dos juízos matemáticos, como 2 + 3 = 5. Kant argumenta que a verdade desta proposição é necessária, absoluta e não necessita de comprovação da experiência.
Qual é a incógnita X em que se apóia o entendimento quando crê encontrar fora do conceito A um predicado B, que lhe é estranho, mas todavia considera ligado a esse conceito? (...) Ora é sobre estes princípios sintéticos, isto é, extensivos, que assenta toda a finalidade última do nosso conhecimento especulativo a priori (...). (KANT, 2001, p. 45)
Depois da Introdução, Kant irá concluir que apenas serão suficientemente válidos os juízos sintéticos a priori cujo objeto se dá no mundo fenomenal. Aquilo que para nós não se dá no tempo e no espaço, o numenal, não pode ser conhecido. -- Como são possíveis os juízos sintéticos a priori? Caius Brandão.
Se aquilo que “para nós não se dá no tempo e no espaço, o numenal, não pode ser conhecido” então também o mundo da matemática não pode ser conhecido senão enquanto mero formalismo racionalista à priori. Na verdade a preposição 2 + 3 = 5 “é necessária, absoluta e não necessita de comprovação da experiência” apenas no mundo fechado da matemática porque na física teria que corresponder a objectos do mundo dos fenómenos e teria que ser sujeito a processos de contagem e recontagem de acordo com o processo trabalhoso do metódico experimental. Assim sendo, de imediato se suspeita que o raciocínio indutivo matemático seja uma apropriação incorrecta do termo que só é aplicável às ciências experimentais.
Mesmo que você não seja fera em matemática, muito provavelmente você sabe que o número 1, se elevado ao quadrado, é igual a 1. E que se elevarmos 1 à potência de 8, ainda assim o resultado será 1. E quanto é 1 elevado à octagésima-nona potência? Não precisa usar a calculadora, a resposta é 1! Bem, você não vai ficar surpreso se eu disser que 1 elevado a um milhão, oitocentos e dezessete mil, quatrocentos e nove é igual a… 1! Temos então, por indução, que o número 1, se elevado a qualquer outro número, será sempre 1. Eis uma verdade incontestável (pelo menos por enquanto!). -- Pensando a ciência – parte 1 – Indutivismo, por Alexey Magnavita.
Na verdade para se chegar à certeza de que “o número 1, se elevado a qualquer outro número, será sempre 1” é uma dedução algébrica pura a partir da teoria dos números e não uma indução experimental por medições e contagens de fenómenos naturais.
Desenhe trinta triângulos diferentes, e você perceberá que a soma de seus ângulos internos será sempre igual a 180 graus. Desenhe mil triângulos, oito milhões de triângulos, e você jamais, sob hipótese alguma, encontrará algum cuja soma dos ângulos internos seja menor ou maior do que 180 graus. Temos outra verdade absoluta, ainda que seja possível falarmos em triângulos que fogem a esta regra se sairmos da geometria euclidiana. Mas dentro dos parâmetros da geometria euclidiana é impossível falarmos em triângulos com 4 lados, por exemplo, ou com ângulos internos que, somados, tenham 420 graus. Pensando a ciência – parte 1 – Indutivismo, por Alexey Magnavita.
A certeza de que o triângulo tem sempre 180º decorre da própria definição de triângulo na geometria euclidiana e do próprio conceito de graus e ângulos na geometria.
Através do caso particular 13 + 23 + 33 + 43 = 102, Polya coloca a seguinte hipótese: A soma dos primeiros n cubos é um quadrado. O autor tenta seguir os mesmos passos que um naturalista seguiria para provar a existência de uma lei geral, ou seja, ele investigaria outros casos especiais. Para n=2 ou 3 a certificação é simples; o caso n=5 é o próximo (13 + 23 + 33 + 43 + 53= 152), acrescentaria, para salvaguardar a uniformidade e completude, o caso n=1 e arranjando todos estes casos, como um geólogo arranjaria os espécimes de um certo minério, obteria uma tabela verdade. (...)
O matemático se expressa com maior reserva embora fundamentalmente pense da mesma forma. Ele diria que o teorema seguinte é fortemente sugerido por indução: “a soma dos primeiros n cubos é um quadrado”. Surge aqui a diferença entre os dois processos em causa; para o naturalista a lei geral é quase provada por indução; para Polya a matemática tem uma fase experimental muito parecida com as ciências da natureza, no entanto, a observação de alguns casos particulares arranjados elegantemente apenas lhe permite dizer que o teorema é fortemente sugerido, mas não permite provar a sua verdade.
Poder-se-ia dizer que a indução matemática difere da indução clássica, na medida em que contém uma demonstração. -- O método indutivo Gerardo Valdisio Rodrigues Viana.
Qual é a incógnita X em que se apoia o entendimento quando crê encontrar fora do conceito A um predicado B, que lhe é estranho, mas todavia considera ligado a esse conceito?” É imperdoável que o criticismo de Kant não lhe tenta aberto os olhos para verificar que a reposta a esta questão não tem nada a ver com a racionalidade dos juízos sintéticos “à priori” mas só e apenas com a constância fenoménica do “determinismo físico” que parecia universal desde Galileu até ao positivismo mas que com a física quântica entrou no colapso da função de onda.
Se na mecânica clássica a descrição completa de um sistema consistia na tarefa de encontrar a posição e a velocidade de todas as partículas e, com esta descrição, ser possível prever todos os movimentos futuros e passados do sistema, na mecânica quântica não se pode descrever todos as grandezas desejadas com a mesma certeza (ver Princípio da incerteza de Heisenberg). (...).
Por isso, depois do nascimento da mecânica quântica, a ciência alcançou um patamar que encerra o contraste entre o determinismo e o indeterminismo e, sob os auspícios da ciência contemporânea, temos a função de onda, que está na fronteira entre o determinismo e o indeterminismo.
O colapso da função de onda é um processo físico associado ao problema de medição na mecânica quântica envolvendo a brusca mudança de estado de um sistema depois se ter obtido uma medida. (...) O aspecto não-local da natureza sugerida pelo Teorema de Bell, está de acordo com a teoria quântica pelo colapso da função de onda, que é uma alteração súbita da função global de onda como um sistema. Ocorre quando qualquer parte do sistema é observada.
Isto é, quando se faz uma observação / medição do sistema em uma região, a função de onda varia instantaneamente, e não apenas na região da medida como em qualquer outra por muito distante
Obviamente que o determinismo à outrance, gerador de juízos sintéticos à priori, já era discutível nas ciências biológicas e mais discutível se tornou nas ciências psicossociais e políticas. De facto, o determinismo que o sucesso público e cultural da física newtoniana promoveu resulta do seu objecto se encontrar no “mundo supra lunar” que era inacessível ao aristotelismo mas que havia sido recentemente conquistado à experiencia sensível pela “luneta de galileu” de tal modo que o “lugar natural” dos corpos celestes dos gregos antigos e dos que seguiam errada e cegamente Aristóteles deixou subitamente de ser eterno e imutável para ser apenas determinístico. Moral da história: em ciência nunca se deve ser fiel a ninguém a não ser ao método científico e, pelo contrário, deve-se sempre explorar as mínimas falhas dos paradigmas científicos para os refutar e refazer novamente.

PARADOXOS DE ZENÃO
Uma investigação das causas e efeitos dos movimentos” pode acabar em pura metafísica que os gregos levaram até a exaustão desde a filosofia de Heráclito até aos Paradoxos de Zenão.
Tudo flui e nada permanece; tudo se afasta e nada fica parado...
O mesmo homem não pode atravessar o mesmo rio, porque o homem de ontem não é o mesmo homem, nem o rio de ontem é o mesmo do hoje.
El devenir está animado por el conflicto: «La guerra (pólemos) es el padre de todas las cosas», una contienda que es al mismo tiempo armonía, no en el sentido de una mera relación numérica, como en los pitagóricos, sino en el de un ajuste de fuerzas contrapuestas, como las que mantienen tensa la cuerda de un arco.
É na mudança que as coisas encontram repouso...Heráclito, fragmentos.
Enquanto Heráclito ensinava que tudo está em perpétua mutação, Parmênides desenvolvia um pensamento completamente antagónico: “Toda a mudança é ilusória”.
Quanto às mudanças e transformações físicas, o Devir, que a todo instante vemos ocorrer no mundo, Parmênides as explicava como sendo apenas uma mistura participativa de ser e não-ser. “Ao vir-a-ser é necessário tanto o ser quanto o não-ser. Se eles agem conjuntamente, então resulta um Devir”.
Os paradoxos de Zenão são argumentos pela redução ao absurdo de passagens ao infinito em pressupostos mentais utilizados para provar a inconsistência dos conceitos de multiplicidade e divisibilidade que o movimento implica. Obviamente que a ideia triunfante de que o cálculo infinitesimal veio resolver de vez estes paradoxos é uma pura ilusão! Jamais a ciência resolverá paradoxos metafísicos mesmo que se trata da mais metafísica de todas as ciências que é a matemática!
Quando falamos do processo limite, falamos de uma incógnita que "tende" a ser um determinado número, ou seja, no limite, esta incógnita nunca vai ser o número, mas vai se aproximar muito, de tal maneira que não se consiga estabelecer uma distância que vai separar o número da incógnita. Em poucas palavras, um limite é um número para o qual y = f(x) difere arbitrariamente muito pouco quando o valor de x difere de x0 arbitrariamente muito pouco também.
(…) Então, no limite é como se pudéssemos substituir o valor de x para resolvermos o problema. Na verdade, não estamos substituindo o valor, porque para o cálculo não importa o que acontece no ponto x, mas sim o que acontece em torno deste ponto. Por isso, quando falamos que um número "tende" a ser n, por exemplo, o número nunca vai ser n, mas se aproxima muito do número n.
Como se vê o cálculo diferencial está longe de ter poderes milagrosos porque epistemologicamente não passa de um processo de aproximação ao limite infinitesimal da incerteza mínima que deixaria Zenão pouco convencido.
De acordo com a dedução de António Saraiva, essa demonstração matemática é possível. Partindo da Hipótese de que zero é igual a infinito, deduz-se que:
0 = ∞
log 0 = log (+∞)
-∞ = +∞
log (-∞) = log (+∞)
log (-1) + log (+∞) = +∞
i.π + ∞ = ∞
∞ = ∞
A conclusão é que o zero é igual a infinito e, vice-versa, que o infinito é igual a zero. – Cláudia Penélope Fournier, A Viagem no Tempo.
A hipótese de António Saraiva de que 0 = ∞ é absurda, contrária ao pensamento matemático matemática e anti metafísica!
A verdadeira fórmula do universo racional é que o nada é o inverso / contrário de tudo e que a unidade resulta de um somatório infinito de nadas.
1 = ∞ * 0
A verdadeira resposta aos paradoxos de Zenão não será a do cálculo diferencial mas a de uma meta-matemática que considere que em todos os paradoxos onde há divisão ad infinitum resulta numa infinitude de pontos nulos que no caso do movimento carece de um tempo com uma infinidade de instantes nulos para os percorrer e cujos somatórios são iguais à unidade, de tal modo que 1 = ∞ * 0.
Obviamente que a unidade é convencional e pode ser sempre arbitrada consuante a bitola que se quiser e na quantidade real necessária.
Esta foi a intuição de Descartes que por envolver um vórtice de pensamento difícil de expressar e mais ainda de comprender deixou de ser levada a sério pelo pensamento moderno. De facto, Descartes deveria ter-se limitado a formolar uma espécie de mistério da santíssima trindade do movimento evitado de seguida qualquer tipo de raciocínio mecanicista para o explicar porque nas fronteiras metafísicas em que estas intuições se dão tudo o que se possa dizer é vão e incerto como é o que a contece a todas as teorias unificadora e do todo.
33. Como em cada movimento deve haver um círculo [ou anel] de corpos que se movem conjuntamente.
Feita esta demonstração, a saber, que todos os lugares estão repletos de corpos e que cada parte da matéria é de tal modo proporcional ao tamanho do lugar que ocupa [que seria impossível que preenchesse um lugar maior ou que se comprimisse para ocupar um que fosse mais apertado, ou que qualquer outro corpo possa ocupar esse lugar enquanto ela lá se encontra], devemos concluir portanto que tem de haver necessariamente um círculo de matéria ou [anel] de corpos que se movem em conjunto ao mesmo tempo; e de tal maneira que quando um corpo deixa o seu lugar para que outro o preencha, vai ocupar o do outro e assim sucessivamente até ao último, que nesse instante ocupa o lugar deixado pelo primeiro. E facilmente verificamos que isto é um círculo perfeito pois, sem recorrermos ao vazio e à rarefacção ou à condensação, vemos que a parte A deste círculo pode mover-se para B, já que a sua parte B se move ao mesmo tempo para C e C para D, e D para A.
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Fig. 3
Mas se tivermos em conta que todas as desigualdades dos lugares podem ser compensadas por outras desigualdades pertencentes ao movimento das partes, facilmente verificaremos que esse movimento conjunto da matéria também acontece no círculo mais imperfeito e irregular que se possa imaginar. Assim, toda a matéria compreendida no espaço EFGH pode mover-se circularmente, e a sua parte que se dirige para E pode
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Fig. 4
passar para G, e a que se dirige para G pode passar ao mesmo tempo para E, sem que seja necessário supor a condensação ou o vazio, desde que -- supondo que o espaço G é quatro vezes --- maior do que o espaço E duas vezes maior do que os espaços F e H - também suponhamos que o seu movimento é quatro vezes mais rápido para E do que para G, e duas vezes mais rápido do que para F ou H, e que em todos os locais deste círculo a velocidade do movimento compensa a exiguidade do lugar. Por conseguinte, este processo permite-nos saber que, em qualquer espaço de tempo que queiramos determinar, neste círculo
passaria tanta matéria por um sítio como por outro.
A descrição puramente geométrica de um movimento num espaço em que “todos os lugares estão repletos de corpos” e em “que e que cada parte da matéria é de tal modo proporcional ao tamanho do lugar que ocupa” implique “concluir (...) que tem de haver necessariamente um círculo de matéria ou [anel] de corpos que se movem em conjunto ao mesmo tempo; e de tal maneira que quando um corpo deixa o seu lugar para que outro o preencha, vai ocupar o do outro e assim sucessivamente até ao último, que nesse instante ocupa o lugar deixado pelo primeiro” (...) sem que seja necessário supor a condensação ou o vazio” envolve passagens ao limite ad ifinitum em todas as ordens de grandezas relativas de espaço e de tempo e são de facto um exercício mental violento e turbulento difícil de seguir. Estas passagens ao limite não podendo ser instantâneas poderia acabar por explicar especulativamente, na perspectiva do pensamento cartesiano, a razão metafísica da relatividade do movimento, bem como a realidade natural do atrito de que resulta a impossibilidade prática do motor eterno em movimento linear uniforme.
34. Daqui se segue que a matéria se divide em partes indefinidas e incontáveis, ainda que não as compreendamos.
É no entanto necessário confessar que neste movimento há algo que o nosso espírito concebe como verdadeiro mas que, apesar de tudo, não consegue compreender, a saber: a divisão de algumas partes da matéria até ao infinito, ou até a uma divisão indefinida, e cujas partes são tantas que o nosso pensamento não consegue conceber uma tão pequena que não se divida também noutras ainda mais pequenas. A matéria que ocupa o espaço G não pode preencher sucessivamente todos os espaços entre G e E, sucessivamente mais pequenos ate inumeráveis graus, se qualquer das suas partes não mudar a sua figura e não se dividir [sempre que necessário] para ocupar exactamente os tamanhos desses espaços incontáveis [diferentes uns os outros]; mas para que isto aconteça é necessário que todas essas pequenas parcelas que supomos pertencer à divisão de uma das partes - e que de facto são incontáveis - se distanciem um pouco umas das outras; e por mais pequeno que este intervalo seja, não deixa de ser uma verdadeira divisão.
35. Como se faz esta divisão e como não se pode duvidar de que ela se pode fazer, embora não a compreendamos.
Há que observar que não falo de toda a matéria, mas apenas de alguma das suas partes. Ainda que imaginássemos que no espaço G há duas ou três partes do tamanho do espaço E, e que há outras ainda mais pequenas e em maior quantidade que permanecem indivisas, todavia compreendemos que todas se podem mover circularmente na direcção de E, desde que aí houvesse outras misturadas -- e que mudam de figura em tantas maneiras como se estivessem unidas às que não podem mudar de figura facilmente, mas que se deslocam mais ou menos depressa conforme o lugar que devem ocupar -- , e assim poderiam preencher todos os ângulos [e pequenos recantos nos quais as outras não caberiam por serem demasiado grandes]. Ainda que não compreendamos como acontece esta divisão indefinida, não devemos duvidar que ela não se faça, pois compreendemos que ela se deduz necessariamente da natureza da matéria de que já temos um conhecimento muito distinto, e também compreendemos que esta verdade pertence àquelas que não conseguimos compreender, pois o nosso espírito é finito. -- René DESCARTES, PRINCIPIOS DA FILOSOFIA.
Aparentemente parece que Zenão mais não fez do que lembrar o pensamento da escola dos eleatas onde Parménides no seu poema Sobre a Natureza e sua Permanência tinha deixado claro que se há a Unidade, há imobilidade do Ser e, por isso, o mundo sensível é uma ilusão!
Toda nossa realidade é imutável, estática, e sua essência está incorporada na individualidade divina do Ser-Absoluto, o qual permeia todo o Universo. Esse Ser é omnipresente, já que qualquer descontinuidade em sua presença seria equivalente à existência de seu oposto – o Não-Ser.
Esse Ser não pode ter sido criado por algo pois isso implicaria em admitir a existência de um outro Ser. Do mesmo modo, esse Ser não pode ter sido criado do nada, pois isso implicaria a existência do “Não-Ser”. Portanto, o Ser simplesmente é.
Quanto às mudanças e transformações físicas, o Vir-a-Ser, que a todo instante vemos ocorrer no mundo, Parmênides as explicava como sendo apenas uma mistura participativa de ser e não-ser. “Ao vir-a-ser é necessário tanto o ser quanto o não-ser. Se eles agem conjuntamente, então resulta um vir-a-ser”.
Um desejo era o fator que impelia os elementos de qualidades opostas a se unirem, e o resultado disso é um vir-a-ser. Quando o desejo está satisfeito, o ódio e o conflito interno impulsionam novamente o ser e o não-ser à separação.
Parmênides chega então à conclusão de que toda mudança é ilusória. Só o que existe realmente é o ser e o não-ser. O vir-a-ser é apenas uma ilusão sensível. Isto quer dizer que todas as percepções de nossos sentidos apenas criam ilusões, nas quais temos a tendência de pensar que o não-ser é, e que o vir-a-ser tem um ser.
Seguramente que Parménides tinha um conceito de ilusão de acordo com a mitologia do seu tempo o que devidamente traduzido em linguagem moderna estaria mais proximo do relativismo relacional. De facto, sendo ilusório “o não nada” impede que as ciências da natureza estudem o mundo sensível de acordo com aquilo que ele nos aprece ser. Parménides tem talvez um plavra mais áspera é para aqueles que se esquecem que há “um caminho da verdade (alétheia) e outra que trata do caminho da opinião (dóxa), ou seja, daquilo onde não há nenhuma certeza. Descartes, a respeito da natureza última do movimento, parece ter entrado por esse vórtice paranóico onde a opinião especulativa se perde na busca de falsas certezas tanto mais que se sabe de antemão serem tão incognoscíveis como o dogma da Santíssima Trindade dos cristãos.
A metafísica do movimento de Descartes acenta na de Aristóteles que pressupunha a divisibilidade e a ausencia de vazio factos que Parménides contestaria porque não é possivel pensar uma verdadeira divisibilidade material sem descontinuidade que passe pelo vazio, razão que iria levar ao espaço permeavel pela mistura do cheio e do vasio de Newton.
Na verdade a substancia do Ser pode ser pensada como Una e indivisível sendo a ilusão do movimento apenas concevível como “função de onda” dum Ser infinitamente elástico e permeável ad infinitum o que faria do movimento um emaranhados de “cordas” e fios onde os corpos seriam meros novelos ou nós do Ser emaranhado pelos complexos e infinitos movimentos como quiçá será o pensamento da «teoria das cordas». Na verdade, a metafísica da indivisibilidade do Ser gera uma física ainda mais complexa do que física relalistica comum. Obviamente que a física metafísica é impraticável. Porém, a física real acaba sempre em paradoxos porque implica a divisibilidade do Ser Absoluto que por definição é Uno e indivisível...ou nem Substantivo seria!
No entanto, a física duma natureza com senso comum não pode ser a que derrapa para as fronteiras da metafísica dos objectos infinitesimais tanto por desconhecimentos fundamentais nos objectos de estudo e pela impossibilidade prática de concluir os experimentos necessários para os por à prova como sobretudo pela natureza finita da condição humana que o incapacita em absoluto para a compreensão tanto do que as “coisas são em si mesmas” quanto da sua textura infinita de que a «física quântica» é apenas o reflexo dos nossos limites sensíveis a esse nível. Ora, os limites da física quântica são o «fotão» porque este é o elemento mínimo de que os sentidos humanos são capazes de perceber tal como as fronteiras reais do universo cognoscível são os que dependem da velocidade da luz e possivelmente do seu desgaste final a que equivocadamente se tem chamado fuga para o vermelho por expansão do universo. De facto, é mais simples e plausível postular a fadiga termodinâmica do fotão do que imaginar a infinitude do universo a fugir para o infinito. No entanto, não tem sido esta ideia do senso comum a que tem prevalecido no mundo científico que tende a cair nas malhas da metafísica mais facilmente do que poderíamos supor.
Na medida em que a vocação profissional de Aristóteles seria a de biólogo a física aristotélica nunca passou de uma mera gramática do movimento na Natureza à luz do bom senso e na perspectiva de um racionalista incapaz de deixar de lado os seus preconceitos culturais de nascimento e desprovido dos meios empíricos que, por exemplo, veio a ter Arquimedes mas que os clássicos consideravam impróprios de um homem livre e muito menos de um filósofo, que como homem de cultura superior deveria ser antes de tudo o mais, tal como na época medieval e próxima, todo o doutor deveria ser clérigo.
Además, los proyectiles se mueven aunque lo que los impulsó no esté ya en contacto con ellos, o bien por antipe-rístasis, como suponen algunos, o bien porque el aire que ha sido empujado los empuja con un movimiento más rápido que el que los desplaza hacia su lugar propio. Pero en el vacío ninguna de estas cosas puede ocurrir, ni algo puede desplazarse a menos que sea transportado. (Esto sería rechazado de plano por la Física moderna a partir de Galileo.) -- Aristóteles – Física.
Aristóteles acreditava como qualquer ser humano culto da sua época que um corpo só permanecia em movimento se actuasse sobre ele alguma força contínua porque nenhum fardo se movia sem tracção contínua humana ou animal e foi essa a ideia que foi aceite até ao Renascimento. Tal erro só pode ter ocorrido porque esta suposição era a que ia de encontro ao senso comum que sabia que neste mundo nada se conseguia sem um esforço de trabalho árduo e contínuo. Obviamente que esta ideia ia contra a realidade bem conhecida do lançamento de projécteis que eram uma realidade tão difícil de seguir que permitia conjecturas fantásticas como a do movimento anti peristásico que, sendo entendida como uma suposta intensificação da força de um processo de oposição”, particularmente referida para explicar a reacção exotérmica da cal viva, seria à época difícil de comprovar para o movimento de projécteis.
A teoria aristotélica, embora fosse pouco plausível, inclusive para as pessoas da época, nunca foi contestada até Galileu. Este, através de experiências mais precisas e rigorosas, notou que existia uma força contrária ao movimento – a força de atrito, que faz com que um corpo pare depois de ser lançado. Galileu supôs que, se não existisse atrito, o movimento de um corpo continuaria sem limites após o impulso inicial, contrariando a teoria de Aristóteles. Galileu idealizou uma experiência em que previu que uma bola, se largada de uma determinada altura ao longo de uma rampa sem atrito, rolaria exatamente até à mesma altura numa rampa semelhante colocada em frente da anterior, independentemente do comprimento da trajetória, tal como se pode ver na figura 1.
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Foi assim que surgiu a primeira definição de inércia: “Um corpo continuará a mover-se com uma velocidade constante numa superfície infinita sem atrito”.
Aristóteles, como a maioria dos nobres gregos nunca ousaria carregar pesos que nunca estão bem quando levados às costas pelo que também nunca lhes sentiria a fricção e assim lhes ficou para sempre vedada a intuição do «atrito» como causa universal da degradação da quantidade de movimento, que de outro modo seria eterno até que algo o parasse. A verdade, porém, é que esta suposição é quase um acto de fé platónico no racionalismo indutivo de Galileu...que obviamente partilhamos também por puro bom senso da razão prática mas não pela convicção de que assim seja na realidade. O postulado de galileu do movimento eterno sem atrito equivale no limite ao perpetuum mobile que além de violar as leis da termodinâmica violaria também a chamada Lei Áurea da Mecânica, segundo a qual o trabalho aplicado é igual ou maior que o trabalho realizado. Dito de outro modo se Aristóteles ficou envergonhado por Galileu na questão do impulso veio a ser parcialmente vingado por Carnot na questão da possibilidade de alguma forma de acção contínua que vença e compense a degradação de energia e do atrito.
«Atrito» < Lat. attritu < Ad-ter-itu, adj. que tem atrição; • roçado; • s. m. resistência que um corpo desenvolve quando sobre ele se move outro corpo; • fricção entre dois corpos duros e ásperos; • s. m. pl. dificuldades, obstáculos.
Attrition (n.) = 1540s, "abrasion, a scraping," from Latin attritionem (nominative attritio), literally "a rubbing against," noun of action from past participle stem of atterere "to wear, rub away," figuratively "to destroy, waste," from ad- "to" (see ad-) + terere "to rub" (see throw = Look up"to project, propel," c.1300, from Old English þrawan "to twist, turn, writhe, curl," (past tense þreow, past participle þrawen), from Proto-Germanic *threw- (cognates: Old Saxon thraian, Middle Dutch dræyen, Dutch draaien, Old High German draen, German drehen "to turn, twist;" not found in Scandinavian or Gothic), from PIE *tere- (1) "to rub, turn, rub by turning, bore" (cognates: Sanskrit turah "wounded, hurt," Greek teirein "to rub, rub away," Latin terere "to rub, thresh, grind, wear away," Old Church Slavonic tiro "to rub," Lithuanian trinu "to rub," Old Irish tarathar "borer," Welsh taraw "to strike").
Em assuntos de etimologia muitas vezes a semântica mais correcta está onde menos de espera. Os animais de «tiro» comprovam com a antiga igreja eslava o conceito de arrastamento de peso como sendo o sentido comum do esforço que Aristóteles confundia como sendo o que movia os corpos quando era apenas a força de atrito que os impedia de se moverem livremente.
"O ridículo da opinião de Aristóteles é mais claro do que a luz. (...)se duas pedras forem lançadas ao mesmo tempo de uma torre alta, tendo uma o dobro do tamanho da outra, quem vai acreditar que a mais pequena vá a meio do caminho quando a grande esta a chegar ao chão?" (...)
"- Simplicio - A sua discussão é deveras admirável; no entanto acho difícil de acreditar que uma lágrima de pomba se mova com a mesma velocidade de uma bala de canhão.
- Salviati – (...) Aristóteles afirmou: 'Uma bola de ferro de cem libras, caindo de uma altura de cem cúbitos, chega ao chão antes que uma bola de uma libra tenha caído de um simples cúbito'. Eu digo que chegam ambas ao mesmo tempo. Descobre, se fizer a experiência, que a maior precede a menor de dois dedos; isto é, quando a maior bate no chão, a outra está ainda acima dois dedos. Não pode meter nestes dois dedos os noventa e nove cúbitos de Aristóteles".
Galileu ridicularizou o pensamento de Aristóteles par enfatizar o seu pensamento e por isso exagerou as próprias palavras de Aristóteles o que tem mais de polémica (dialéctica de informação) do que de promoção da boa nova científica. Começamos a suspeitar que a sanha da Inquisição contra Galileu teria tanto a ver com razões de política papal da contra reforma como da falta de taco da personalidade truculenta deste génio.
Os escritos de Aristóteles sobre a queda dos corpos não são de modo algum claros. Vale, porém, a pena citar uma passagem mais transparente do volume "De Caelo":
"O movimento para baixo de uma massa de ouro ou chumbo ou de qualquer outro corpo dotado de peso é tanto mais rápido quanto maior for o seu tamanho".
De facto, é precisamente isto o que se observa. Se se deixarem cair, no ar, dois corpos maciços de igual natureza e com a mesma forma (por exemplo, esférica), vê-se que o maior é, portanto, mais pesado chega primeiro ao chão. Aristóteles tinha e tem, neste ponto particular, razão.
Numa outra sua obra, "Physica", Aristóteles escreve: "Vemos que corpos com maior tendência de peso ou de leveza, mas semelhantes em todos os outros aspectos, se movem mais rapidamente no mesmo espaço e isto na razão que tenham entre si os valores dessas tendências. Por isso mover-se-ão também no vazio com esta razão de velocidades. Mas tal e impassível; porque deve um corpo ser mais rápido do que o outro?".
Os corpos com maior peso cairiam, segundo Aristóteles, no ar mais rapidamente (no tempo dos gregos não havia bombas de vácuo nem se viajava no espaço, pelo que só no ar se podia observar a queda dos corpos!). A velocidade de queda, aparentemente constante, seria proporcional ao peso. Hoje sabe-se que a velocidade de queda de um corpo no ar aumenta até acabar, eventualmente, por atingir um valor constante - a velocidade terminal - e que esta velocidade é, realmente, tanto maior quanto maior for o peso do corpo. Não é directamente proporcional ao peso, como presumia Aristóteles, mas sim, para um objecto esférico, proporcional à raiz quadrada do peso (o peso, por sua vez, só é directamente proporcional ao tamanho se por tamanho se entender o volume do corpo e não qualquer dimensão linear). Não é inversamente proporcional à força de resistência do meio, como Aristóteles noutro passo dá a entender, mas tem, de facto, a ver com essa força. A velocidade terminal é inversamente proporcional à raiz quadrada da secção transversa de um objecto esférico, que é uma medida da resistência experimentada durante o movimento no ar.
Repare-se que Aristóteles acha natural que os corpos mais pesados caiam mais rapidamente do que os mais leves não só no ar como também no vazio, mas encontra logo aí uma questão: "porque deve um corpo (, no vazio,) ser mais rápida do que o outro?)". Não encontra nenhuma boa razão para tal e, com base neste paradoxo, conclui um pouco mais adiante que não existe vazio. É o "horror ao vácuo" dos antigos!
"(...) se observarmos um objecto não particularmente pesado a cair de uma certa altura, tal como uma bola de lã, uma pena ou algo de semelhante, veremos que ele se move de inicio lentamente, mas que pouco depois passa a ter movimento uniforme. A razão por que tal acontece de forma mais clara para as coisas mais leves é que as coisas, quando se começam a mover, sofrem uma força contrária, de grandeza igual ao seu próprio peso. Se as coisas forem pouco pesadas então a força contrária será pequena, sendo esta força rapidamente anulada; e quando é anulada, o objecto passará a andar com movimento uniforme. É mais fácil observar a uniformidade do movimento de uma coisa que se mova devagar do que de uma coisa que cai muito rapidamente. Mas uma vez que a força contrária a vencer na queda de coisas pesadas é enorme, é necessário um grande intervalo de tempo para a anular; nesse tempo, uma vez que elas se movem muito rapidamente, descerão um espaço grande. Como não temos à disposição os ditos grandes espaços nos quais os corpos pesados deviam ser largados, não admira que se uma pedra cair apenas da altura de uma torre pareça acelerar durante todo o tempo até chegar ao chão, uma vez que este espaço e tempo pequenos não serão suficientes para anular toda a fora contrária."
É errado que a "força contrária", que traduz a resistência do ar, seja de inicio igual ao peso. De inicio é nula, se o corpo partir do repouso; passa a ser muito pequena quando o corpo se passa a mover e fica igual ao peso, sempre constante (despreza-se a variação da aceleração da gravidade com a altura, por ser insignificante), quando se atinge o regime de velocidade terminal. Mas o tempo que demora a atingir a velocidade terminal é, de facto, maior para os corpos grandes. For isso é que corpos pesados, quando largados do cimo de uma torre baixa, não chegam a atingir a velocidade terminal.
Um corpo em queda livre no ar sofre uma força total não nula (e, portanto, acelera) até atingir a velocidade terminal, altura em que passa a mover-se com velocidade constante. Na verdade, o corpo está sempre a acelerar, embora a aceleração seja cada vez menor. Não há, de facto, um instante preciso para o qual se possa dizer que se estabeleceu o regime de movimento uniforme, embora se possa indicar a ordem de grandeza de tempos para a qual se dá uma certa mudança de comportamento cinemático. Numa primeira fase do movimento, podemos dizer que todos os corpos se comportam mais ou menos como no vazio, aumentando a sua velocidade mais ou menos da mesma maneira (a derivada da velocidade é praticamente a aceleração da gravidade terrestre para todos, uma vez que a aceleração devida à força de resistência do ar é comparativamente muito pequena). Essa é a região que podemos denominar de "galileica". Numa segunda fase do movimento, os corpos mantêm velocidades constantes, conforme pretendia Aristóteles, variando essa velocidade conforme o tamanho do corpo. Essa é a região que podemos apelidar de "aristotélica". A transição entre as duas fases é mal definida. Convencionalmente, considera-se que a primeira dura durante um tempo que é obtido dividindo a velocidade terminal pela aceleração da gravidade.
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FIG.1- Velocidades em função do tempo para a queda de 3 esferas de ferro, 1, 2 e 3. A esfera 1, pontual, não sofre resistência do ar. As esferas 2 e 3 são de ferro, tendo 2 uma massa de 45,4Kg e 3 uma massa de 0,454Kg.
Salientar a primeira ou a segunda fase do movimento depende da respectiva importância relativa num dado contexto particular. Se lançarmos uma pena ou um balão do cimo de uma torre de 56m verificamos que eles entram passado pouco tempo e, portanto, depois de percorrerem uma distância pequena, no regime de velocidade terminal, pelo que se tratam de objectos "aristotélicos" (por "pouco tempo" e "distância pequena" entendem-se respectivamente tempos e distâncias muito menores que os tempos e as distâncias totais observadas). Uma tal queda pode ser filmada com uma câmara de vídeo doméstica, sendo o movimento uniforme reconhecido com o auxílio de um relógio e de uma fita métrica. Uma galinha ou uma bola de chumbo, pelo contrário, demoram mais tempo a entrar no referido regime, podendo nem sequer chegar a entrar nele, ao cair de uma torre como a de Pisa, pelo que são objectos "galilaicos". Já serão objectos "aristotélicos" se forem lançados do cimo do "Empine State Building" (380m), em Nova Iorque. -- ARISTÓTELES, GALILEU E A QUEDA DOS GRAVES, Carlos Rolhais e João Paiva Departamento de Física da Universidade de Coimbra.
Como se depreende do conflito entre Galileu e Aristóteles, na falta de experimentos sensíveis, estes sábios divergiam sobretudo pela importância que atribuíam ao atrito que na física de Aristóteles seguia a que o senso comum lhe atribuía e que em Galileu e nos modernos se torna desprezível tendendo para ser nulo no espaço vazio e absoluto de Newton. No entanto, o atrito é, de certo modo, o preço termodinâmico de peagem que o movimento paga à natureza para evitar os conflitos e contradições dos paradoxos de Zenão assim como a dúvida racional de por um lado o movimento não ser possível sem o vazio e por outros serem neste impossíveis acções de braços de forças sem o ponto de apoio que só o atrito pode oferecer. Todos sabemos intuitivamente que um carro ficaria em “roda livre”, e sem andar, numa superfície sem qualquer atrito tal como andar de bicicleta numa passadeira rolante resulta em pedaladas inúteis sem deslocamento espacial o que em termos práticos poderia ser considerado um trabalho “só para aquecer”, ou seja, sem sentido prático!
Para Leibniz, o problema do movimento dá uma resolução aos paradoxos de Zeno. Uma vez que o movimento é contínuo, o espaço deve ser infinitamente divisível. Para que nada absolutamente comece a se mover, deve haver alguma propriedade mental e voluntária ou alguma força inerente nos constituintes básicos do universo que impulsiona as coisas. Este conatus é uma espécie de movimento instantâneo ou "virtual" que todas as coisas possuem, mesmo quando elas estão estáticas. O movimento, entretanto, é apenas a soma de todos os conatus que uma coisa possui, juntamente com as interações das coisas. O conatus está para o movimento como um ponto está para o espaço. O problema com este ponto de vista é que um objeto que colide com outro não seria capaz de se recuperar, se a única força em jogo for o conatus. Portanto, Leibniz foi forçado a postular a existência de um éter que mantém os objetos se movendo e "autorizados" a colisões elásticas. O conceito de Leibniz de uma propriedade mind-like memory-less de conatus, acoplado à sua rejeição aos átomos, enventualmente levou a sua teoria das mónades.
Adiante se verá que no limite a questão da aceitação do vazio físico como entidade real marcará não apenas o desastre do materialismo moderno como o começo da introdução do pensamento mágico na física relativista e quântica!

A MODERNIDADE E O RACIONALISMO CARTESIANO
Parece que Descartes sofria ainda do mesmo preconceito que o impediu de intuir por completo a importância da física de Galileu que manifesta desconhecer quase por completo seguramente por nunca o ter lido, tal terá sido o terror que lhe provocou a notícia da sua prisão e julgamento às mãos da Inquisição por defender as teorias de Copérnico.
De facto, só em 1629 começou a trabalhar em "Tratado do Mundo", uma obra de física. Mas em 1633, quando Galileu foi condenado pela igreja católica, Descartes não quis publicá-lo.
Os livros de Galileu foram incluídos no Index, censurados e proibidos, mas foram publicados nos Países Baixos, onde imperava o protestantismo mas os tempos cartesianos eram de contra-reforma, politicamente muito conservadores e muito conturbados socialmente por isso o espírito mais comodista que acomodado de Descartes não lhe terá permitido ler Galileu na Holanda.
Descartes sempre alegou que nada em sua obra era influência do trabalho de outros e de Galileu e Copérnico apenas terá sabido o que ouviu falar.
De facto o que há de mais espantoso na obra de Descartes é, por um lado a completa originalidade do que nela é válido e por outro a infeliz incompletude e os profundos erros experimentais do que nela poderia ter sido grandiosa se tivesse seguido os passos pioneiros dos seus antecessores modernos. Na verdade, a física de Descartes segue mais o racionalismo de Aristóteles do que o empirismo dos modernos. Aliás, grande parte da sua obra foi publicada anonimamente e, mesmo assim, em 1643 a filosofia cartesiana foi condenada pela Universidade de Utrecht (Holanda) e Descartes foi acusado de ateísmo e apenas sobreviveu porque obteve a protecção do Príncipe de Orange. Em 1667, apesar de ter morrido como um católico num país protestante e enterrado em Estocolmo num cemitério de crianças não baptizadas, a Igreja Católica Romana colocou as suas obras no Index. De facto, ninguém foge às calamidades da história humana.
René Descartes que depois da Universidade seguiu a carreira militar na conturbada guerra da independência da Holanda terá sido menos um actor do que um cauteloso espectador das profundas mudanças da vida social do seu tempo em ambiente violento tanto a nível social como cultural.
Todas estas pretendidas demostraciones de la tercera ley fueron las que finalmente impidieron que las leyes de la naturaleza de Descartes fueran aceptadas por los pensadores de la época – como Newton –, pues veían un racionalismo a ultranza con poca aplicabilidad a la experiencia. Es decir, estas reglas ciertamente forzaban los fenómenos naturales acomodándolos a la fuerza en su visión de los movimientos. De esta manera no es raro encontrar en Descartes una expresión como esta:
“Las demostraciones de todo esto son tan ciertas que aun cuando la experiencia nos pareciera mostrar lo contrario, sin embargo estaríamos más obligados a dar crédito a nuestra razón que a nuestros sentidos”.
Éste, como sabemos, es un presupuesto fundamental en toda la reflexión cartesiana sobre la ciencia, que de ninguna manera, desde este punto de vista, es empirista, sino, racionalista, en el que el conocimiento humano obedece, necesariamente, a procesos racionales y no a la formulación de teorías partiendo de eventos empíricos o experimentales.
¿Cuál es, entonces, la motivación de Descartes para llevar a cabo enunciaciones de esta naturaleza?
El objetivo es claro: llegar a la formulación del principio de conservación del movimiento. Este es un principio fundamental para la cabal comprensión de su física. -- LA FILOSOFÍA DE LA NATURALEZA CARTESIANA, por: Johman Carvajal Godoy.
Descartes tinha afinal, como veio a ser descoberto por Newton, um pensamento contraditório próprio de uma época reaccionária e em transição o que foi uma das razões que levou o grande físico inglês a criar uma física em completa oposição aos erros empíricos de Descartes que foi de facto o produto mais inteligente de uma época decadente, depressiva e cobarde que foi o barroco...na senda da ressaca cultural do fabuloso, divinal e magnífico renascimento!
Newton pretendeu, portanto, explorar as idéias de Descartes onde quer que ocorressem movimentos circulares. Ao constatar a inconsistência da mecânica cartesiana, o objetivo de Newton foi oferecer um tratamento adequado ao conatus recedendi a centro nos movimentos circulares. O seu afastamento do universo metafísico e conceitual da mecânica cartesiana, que progressivamente se aprofundou à medida que suas pesquisas prosseguiram, foi devido ao que Newton considerou como uma impossibilidade de fornecer, por meio da doutrina de Descartes, os conceitos exatos de movimento, lugar e espaco. Assim, Newton compreendeu que seria necessária uma reformulação rigorosa desses conceitos. (...)
O esforço de Newton ao longo do De Gravitatione será no sentido de realizar uma revisão conceitual na doutrina cartesiana que significará admitir que:
(I) o “espaço é distinto do corpo”;
(II) e “o movimento é algo que acontece com respeito às partes do espaço, e não com respeito à posição dos corpos vizinhos”. (...)
A partir deste momento Newton demonstrou a inconsistência da doutrina cartesiana do movimento (que implicaria nas noções de lugar e espaço) com as investigações acerca das condições físicas fundamentais em que ocorrem os movimentos. Porém, um passo decisivo dado por Newton foi a inferência das definições que o ajudariam a sustentar sua própria doutrina do movimento local, lugar, corpo e repouso. O estabelecimento dessas definições foram importantes para se afastar de vez dos pressupostos da física de Descartes, reduzidos a meras “ficções”. --- A gravitação universal na filosofia da natureza de Isaac Newton Valdinei Gomes Garcia Curitiba.
E toda a tragédia da física moderna começou então aqui nesta rejeição newtoniana do racionalismo cartesiano que Leibniz tanto iria criticar.
E porque? Porque a física deixou de ser uma Ciência Natural para se transformar numa geometria do movimento o que não seria nada de grave, antes pelo contrário, se os seus resultados passassem a ser apenas isso e não uma suposta descrição fiel da realidade. Na verdade, Newton fez à física o que Euclides tinha feito à geometria e a moda pegou de tal modo que a gravidade passou a ser mais tarde, com o relativismo de Einstein, como uma deformação da geometria do espaço-tempo. E porquê?
Porque tal como na geometria tudo é pura matemática desenhada à imagem e semelhança das ideias platónicas também na física de Newton quase tudo é matemática onde os conceitos físicos deixam de ser realidade concretas para serem pura definições axiomáticas despidas de todas as referências reais para serem puros espíritos formais inteiramente manipuláveis pelo espírito da razão pura dos juízos sintéticos a prior!
E começam então os mais graves equívocos saídos do mais genial dos espíritos que o empirismo inglês criou nos tempos do iluminismo.
O tempo e o espaço como realidades absolutas da tradição clássica de Euclides passam a substituir a res extensa do racionalismo cartesiano, que malegré tout pretendia ser apenas uma mera racionalização dos dados empíricos fornecidos pelos corpos naturais.
Na verdade, as questões fundamentais da física resultam da confusão entre o espaço e o tempo enquanto critérios de medida que Kant muito bem define como categoria ou conceitos puros a priori do entendimento.
Espaço e tempo Espaço é a forma do sentido externo; e tempo, do sentido interno. Isto é, os objetos externos se apresentam em uma forma espacial; e os internos, em uma forma temporal.
Como Kant prova isso? Pense em uma cadeira em um espaço qualquer, por exemplo, em uma sala de aula vazia. Agora, mentalmente, retire esta cadeira da sala de aula. O que sobra? O espaço vazio. Agora tente fazer contrário, retirar o espaço vazio e deixar só a cadeira. Não dá, a menos que sua cadeira fique flutuando em uma dimensão extraterrena.
E o tempo? Ele é minha percepção interna. Só posso conceber a existência de um "eu" estando em relação a um passado e a um futuro. Só concebemos as coisas no tempo, em um antes, um agora e um depois. Voltemos ao exercício mental anterior: podemos eliminar a cadeira do tempo - ela foi destruída, não existe mais. Porém, não posso eliminar o tempo da cadeira - eu sempre a penso em uma duração, antes ou depois.
A conclusão é de que é impossível conhecer os objetos externos sem ordená-los em uma forma espacial - e de que nossa percepção interna destes mesmos objetos fica impossível sem uma forma temporal. -- Kant - teoria do conhecimento: A síntese entre racionalismo e empirismo, José Renato Salatiel.
Esta intuição de Kant corresponde no espaço à res extensa de Descartes e no tempo a algo que Descartes poderia ter intuído como res intensa da nossa percepção interna mas pensou como sendo uma certa maneira de pensarmos a duração.
O tempo, por exemplo, que distinguimos da duração em geral e que dizemos ser o número do movimento, não passa de uma certa maneira de pensarmos esta duração, visto não concebermos que a duração das coisas que se movem seja diferente das coisas que não se movem: tal como não conta mais tempo num do que noutro quando dois corpos se movem durante uma hora, um depressa e o outro lentamente, embora suponhamos mais movimento num desses corpos. Todavia, para compreendermos a duração das coisas subordinadas a uma mesma medida geralmente servimo-nos da duração de certos movimentos regulares que são os dias e os anos, e chamamos-lhes tempo depois de termos comparado essa duração desse modo; se bem que, de facto, fora da duração das coisas o que assim chamamos é apenas uma maneira de pensar.
Os princípios das causas corporais ou físicas: que há corpos extensos em comprimento, largura e altura, que têm diversas formas e se movem de diversas maneiras. Eis, em poucas palavras, os princípios donde deduzo a verdade das outras coisas.
(...) Assim, a extensão em comprimento, largura e altura constitui à natureza da substância corporal, e o pensamento constitui a natureza da substância que pensa. Com efeito, tudo quanto pode ser atribuído ao corpo pressupõe a extensão e não passa de dependência do que é extenso. Igualmente todas as propriedades que encontramos na coisa pensante são diferentes maneiras de pensar.
(...) Para discernirmos melhor a verdadeira ideia que temos do corpo, tomemos por exemplo uma pedra e retiremos-lhe tudo o que sabemos que não pertence à natureza do corpo. Primeiramente retiramos-lhe a dureza, e nem por isso deixará de ser corpo; depois, a·cor, já que algumas vezes temos visto pedras tão transparentes que não têm cor; tiremos o peso, porque também o fogo, ainda que muito ténue, nem por isso deixa de ser um corpo; tiremos-lhe o frio, o calor e todas as outras qualidades deste género, pois não pensamos que estejam na pedra, ou que a pedra mude de natureza porque umas vezes nos parece quente e outras frias. Depois de assim termos examinado esta pedra descobrimos que a verdadeira ideia que nos faz conceber que é um corpo consiste unicamente em nos apercebermos distintamente de que é uma substância extensa em comprimento, largura e altura; ora, isso mesmo está compreendido na ideia que temos do espaço, não só daquele que está preenchido pelos corpos, mas também daquele que se chama vazio.
9. A substância corporal não pode ser concebida claramente sem a sua extensão.
Apesar de alguns darem outra explicação deste assunto, não penso todavia que concebem outra coisa diferente da que acabo de expor; se distinguem a substancia corporal ou material da extensão e da grandeza, então não subentendem nada com a palavra substância [corporal], ou na sua mente apenas formam uma ideia confusa da substância imaterial que falsamente atribuem à substância corporal, deixando para a extensão a verdadeira ideia desta substância corporal; a esta extensão chamam eles um acidente, mas tão impropriamente que facilmente se vê que as suas palavras não têm qualquer relação com os seus pensamentos.
16. Não pode haver vazio no sentido em que os filósofos tomam esta palavra. Quanto ao vazio, no sentido em que os filósofos tomam esta palavra, isto é, como um espaço onde não há nenhuma substância, é evidente que tal espaço não existe no universo, porque a extensão do espaço ou do lugar interior não é diferente da do corpo. E dado que só podemos deduzir que um corpo é uma substância porque é extenso em comprimento, largura e altura, como concebemos que não é possível que o nada tenha extensão, então devemos concluir a mesma coisa acerca do espaço que se supõe vazio, isto é: dado que ele tem extensão, então é necessariamente substância. -- René DESCARTES, PRINCIPIOS DA FILOSOFIA.
Como facilmente se depreende, embora Descartes tenha tido uma clara intuição da natureza do tempo como forma de o pensamento entender a duração não fez o mesmo para o espaço que teimosamente acabou por sistematicamente confundir com a extensão. Desgraçadamente irá ser esta confusão que irá desacreditar a sua física que Newton acabou por rejeitar como confusa precisamente por Descartes se ter recusado a separar o espaço formal, como forma de o pensamento ordenar e medir a extensão dos corpos, da substância extensiva da realidade que, essa sim, Descartes intuiu clara e distintamente.
Segundo Descartes, a realidade física é totalmente constituída de corpos, e a matéria, por ser a substância desta realidade, não está ausente em lugar algum, e não pode estar, justamente por ser a substância de tal realidade. Desse modo, lugar, espaço e extensão podem ser entendidos como sinónimos, pois não há lugar não preenchido por corpos, ainda que não perceptíveis. A filosofia cartesiana não admite ausência de matéria na realidade física, sendo que esta é organizada a partir e através do movimento dos corpos que constituem tal realidade. É através do movimento que a realidade física é organizada, o que faz do movimento não apenas “mais um” dos modos da substância material, mas um modo determinante em tal substância, um modo determinante para a física cartesiana. Na busca por uma definição mais simples de movimento, Descartes se distancia dos escolásticos e propõe uma definição que, segundo ele, é mais ‘compreensível’, uma vez que:
Eles mesmos admitem que a natureza do [movimento] deles é muito pouco conhecida; e, a fim de torná-la de algum modo inteligível, não foram capazes ainda de explicá-la mais claramente que nestes termos:
Motus est actus entis in potentia, prout in potentia est, os quais são para mim tão obscuros que sou obrigado a deixá-los aqui na sua língua, uma vez que não saberia interpretá-los. (E, com efeito, estas palavras: ‘o movimento é o ato de um ser em potência, enquanto está em potência; não são mais claras por estarem em francês). – O PAPEL DO MOVIMENTO N’O MUNDO DE DESCARTES, Marcos Alexandre Borges.
Já Newton irá fazer o oposto: reduzir o espaço absoluto ao lugar geométrico dos corpos que Kant e os filósofos posteriores viriam a definir como uma categoria e um conceito puro e a priori do entendimento.
Na verdade, as grandes diferenças entre Descartes e Newton resultavam de diferenças metafísicas sobretudo a nível da concepção de espaço e do tempo. Por um lado entende-se que durante a derrocada do mundo físico de Aristóteles iniciado por Galileu tenha levado a algumas incertezas de transição a nível dos postulados metafísicos essenciais da escolástica que como vimos perduram em algumas posições de Descartes. Galileu e Newton, no entanto, foram os que fizeram descobertas físicas mais revolucionárias e portanto também os que mais se atreveram a ter que postular princípios metafísicos mais arrojados. Costumamos dizer que Descartes era um mecanicista que olhava para o universo como se fora uma máquina de relojoaria e possivelmente era este o paradigma dominante da natureza física do começo da renascença mas a verdade é que em Descartes este mecanicismo era sobretudo ingénuo porque no fundo continuava a ser um realismo clássico peripatético que tendia a separar o mundo das ideias, reservadas ao pensamento que funcionava como um mundo virtual, da natureza onde as coisas eram tal como as sentimos e experimentamos, o que, segundo Descartes, significava serem res extensa.
No entanto, o verdadeiro mecanicista foi um Newton maçónico que pretendia descrever uma física natural onde o espaço absoluto seria Deus ex maquina supremo arquitecto e relojoeiro do mundo.
Newton não dispunha da religião como um complemento. O Deus newtoniano deveria ser atuante, fato que marcará sua definição de espaço.
"Reconhecemos, portanto, um Deus infinito, eterno, onipresente, onisciente, o Criador de todas as coisas, o mais justo, o mais bondoso, o mais sagrado. Devemos amá-lo, temê-lo, honrá-lo, confiar nele, orar a ele, agradecer-lhe, glorificá-lo, consagrar seu nome, obedecer a seus mandamentos e dedicar tempo para seu serviço, como nos ordenam o terceiro e o quarto Mandamentos; pois este é o amor a Deus; que cumpramos seus Mandamentos, e eles não são severos. (I João V 3)...”1 (Westfall, 1983:221)
(…) Mário Barbatti insiste que o pensamento dos filósofos era, então, marcado por uma espécie de realismo ingênuo, que se assenta em dois elementos centrais: a filosofia mecânica e a filosofia empírica. A primeira sugere que a matemática (mais precisamente a geometria) fornece elementos que são base segura de certeza e clareza. Essa descrição matemática do mundo só pode ser feita, entretanto, obtendo-se dados da experiência sensível e, para tal, o experimento criterioso é fundamental para o estabelecimento de verdades. Deus seria o elemento que fundamentaria a grandiosidade desse comportamento da natureza, diferenciando-se apenas na forma com que participava do mundo: alguns entendiam que ele atuava constantemente (More, Boyle e Newton), enquanto outros, como Descartes e Hobbes, entediam que sua participação teria sido apenas a de garantir o primeiro motor (Barbatti, 1999:156), imprimindo a quantidade de movimento inicial ao mundo.
Nesse ambiente de intenso debate entre os filósofos da época, Renè Descartes teve um papel fundamental para o estabelecimento das bases metodológicas da nova filosofia. Isso se deve ao fato de que seu dualismo mente-corpo conduz a duas implicações que fomentam as discussões do período: a ateização da natureza (decorrente da ação que Deus possui na máquina do mundo) e a dificuldade de justificar como as duas substâncias se comunicam.
(…) A adoção da existência do espaço absoluto para Newton, veremos, cumprirá duas finalidades: a primeira será teológica, de modo a se permitir a ação direta de Deus sobre sua criação. A segunda, de que Newton, face ao estatuto da nova filosofia, que clama por critérios mais claros e distintos, precisará garantir a realidade empírica do espaço absoluto, visto que este se constitui como não acessível aos sentidos.
(…) O conceito de lugar, absoluto e relativo, será importante, pois dele é que se seguirá a argumentação que levará Newton à demonstração da existência do espaço absoluto. Newton afirma que o lugar é algo que o corpo apenas ocupa transitoriamente, pois, ao se mover, o lugar permanece onde está, podendo ser ocupado, em seguida, por outro corpo. Mas como saber se o lugar é absoluto ou relativo? Tal distinção residirá na forma como Newton define movimentos absolutos e movimentos relativos. “O movimento absoluto é a translação de um corpo de um lugar absoluto para outro e o movimento relativo, a translação de um lugar relativo para outro.(Newton, 1990:8).
(…) Newton sugere uma forma de diferenciar movimento verdadeiro do movimento absoluto, partindo da investigação da ação de uma força impressa. Segundo ele, a aplicação de uma força, no corpo que se move, muda seu movimento absoluto e, conseqüentemente, seu lugar absoluto. Tal fato já não ocorre com o movimento relativo: posso mudar o lugar relativo de um corpo pela simples impressão de uma força aos corpos que se situam ao redor do corpo móvel, que se caracteriza o estado de movimento relativo. Se aplicarmos uma força a um corpo situado nas proximidades do móvel, o movimento relativo deste, em relação ao esse corpo de sua proximidade que sofreu a força, é alterado. Pois se, no mesmo instante em que o corpo usado como referência sofrer a impressão de uma força e o corpo móvel sofrer também uma força, é possível que o estado de movimento relativo não seja alterado. Em função dessa diferença, o movimento circular ganhará um estatuto diferenciado na física newtoniana. (…)
Qualquer corpo em rotação só possui um movimento circular real, correspondendo a um poder de esforçar-se por se afastar do seu eixo de movimento, como seu efeito próprio e adequado; mas os movimentos relativos, em um único e mesmo corpo, são inumeráveis, segundo as várias relações que ele tem para com corpos externos, e, como outras relações, são inteiramente destituídas de qualquer efeito real, além daqueles que possam derivar da participação do movimento verdadeiro e único. E, portanto, no sistema daqueles que supõem que nossos céus, girando abaixo da esfera das estrelas fixas, transportam consigo os planetas, nesse sistema as várias partes desses céus e os planetas, que estão em repouso em relação a esses céus, na verdade se movem. Pois mudam de posição uns em relação aos outros (o que nunca acontece aos corpos verdadeiramente em repouso) e ao serem carregados juntamente com seus céus participam dos movimentos deles, e, como partes de todos em giro, esforçam-se por se afastar do eixo de seus movimentos. (Newton apud Koyré, 1979:161) -- AS BASES TEOLÓGICO-EXPERIMENTAIS DO ESPAÇO ABSOLUTO DE NEWTON, Marcus Vinícius Russo Loures.
As concepções metafísicas de Newton não o impediram de fundar a física moderna mas condicionaram a sua evolução no sentido do seu formalismo matemático moderno quase inacessível ao senso comum pouco dado a matemáticas.
Ninguém nega que há dificuldades na análise da mecânica Newtoniana quando realizada apenas em termos do mecanicismo de segunda ordem [não previa a existência do éter]. Em contraste, porém (ao que nos parece), se afirmarmos que, para Newton, todas as forças eram meros pseudo conceitos e a realidade estava sempre no impacto corpuscular etéreo, estaremos dizendo, na verdade, que os Principia dizem respeito a uma pseudo consciência [...]. Será que os Principia contêm uma visão da realidade, ou serão eles apenas um modelo matemático conveniente –um modo de calcular os efeitos do éter, sem de fato introduzir o mecanismo etéreo? (HALL; HALL, 2002, p. 110).
Mesmo podemos comparar o conceito de substância entre Descartes e Newton que ao lado das variantes Aristotélicas representam as inutilidades conhecidas de conceitos metafísicos não controláveis pela experiência sensível nem pelos usos e costumes da linguagem.
Claro que depois de Descartes ter definido a res extensa como substancia dos corpos se iniciou a confusão destes com o seu “lugar natural” e logo com o espaço repleto destes de todas as formas e tamanhos. Newton, em vez de separar os corpos do seu “lugar natural” de acordo com o seu estado de movimento atirou-os para o vazio solitário do espaço absoluto da acção onde ficaram sujeitos à substancia do mundo já minada de forças que iriam evoluir para os fantasmagóricos campos vectoriais gravíticos e magnéticos. Obviamente que as duas substâncias cartesianas decalcam a dualidades escolásticas matéria / forma; corpo / alma, etc.
Sabemos que Newton quase copiou o primeiro princípio da sua mecânica de Descartes e por isso quase não há divergências no conceito de movimento de ambos.
As grandes diferenças entre Descartes e Newton vão começar na diferenciação entre movimentos relativos e movimentos absolutos por força de concepções diversas de espaço.
Também compreendi a natureza do movimento. Além do mais, também percebi que o espaço não é algo absoluto ou real e que ele nem sofre mudança nem podemos conceber o movimento absoluto, mas que toda a natureza do movimento é relativa, de tal forma que dos fenômenos não podemos determinar com rigor matemático o que está em repouso, ou com que quantidade de movimento algum corpo se move. Isto vale mesmo para o movimento circular, embora não parecesse assim para Isaac Newton, aquele cavalheiro distinto que é, talvez, a maior joia que a Inglaterra culta jamais teve. Embora ele tenha dito muitas coisas esplêndidas sobre o movimento, ele pensou que, com a ajuda do movimento circular, podia discernir qual matéria contém movimento a partir da força centrífuga, coisa com a qual não posso concordar. Mas mesmo se não houver maneira matemática de determinar a hipótese verdadeira, contudo podemos, com boas razões, atribuir movimento verdadeiro à matéria com a qual resultaria a hipótese mais simples para explicar os fenômenos. Em relação ao restante, basta para nós por questões práticas investigar não tanto o sujeito do movimento quanto as mudanças relativas das coisas, umas em relação às outras, já que não há ponto fixo no universo.  
(…) Temos de perceber, acima de tudo, que força é algo absolutamente real nas substâncias, mesmos nas substâncias criadas, enquanto que espaço, tempo e movimento são, até um certo ponto, seres da razão [do intelecto] e que são verdadeiros ou reais, não por si mesmos [per se], mas apenas até o ponto que eles envolvem ou atributos divinos (imensidão, eternidade, a habilidade de realizar trabalho), ou a força nas substâncias criadas. Disto segue imediatamente que não há lugar vazio e [não há] momento de tempo vazio. Além do mais, segue que movimento considerado separadamente da força, isto é, o movimento considerado até o ponto em que contém apenas noções geométricas (tamanho, forma e suas mudanças), não é realmente nada além da mudança de situação e, além isto, no que diz respeito aos fenômenos, movimento é uma relação pura, algo que Descartes também reconheceu ao definir movimento como uma translação das vizinhanças de um corpo para as vizinhanças de outro. Mas ao tirar consequências disto, ele esqueceu sua definição e estabeleceu as leis do movimento como se o movimento fosse algo real e absoluto. Portanto, temos de considerar que quaisquer que sejam as maneiras como muitos corpos possam estar em movimento, não podemos inferir a partir dos fenômenos quais deles têm realmente movimento absoluto e determinado, ou [estão em] repouso. -- Um Exemplar de Dinâmica [Specimen Dynamicum], Leibniz.
(…) O opositor de Leibniz, o grande físico Newton, era anti relacionista. Newton considerava o espaço e o tempo como algo que não consiste apenas em meras relações espaciais e temporais entre objectos e acontecimentos materiais, mas não tinha a certeza do que seriam exactamente. Considerava-os como algo semelhante a uma substância, mas por vezes preferiu concebê-los como atributos ou propriedades — na verdade, como propriedades de Deus. Embora tenha oferecido argumentos puramente filosóficos contra o relacionismo de Leibniz, Newton é mais conhecido por ter defendido que os resultados da observação e da experimentação podem refutar conclusivamente a doutrina relacionista.
Na física desenvolvida por Newton a partir das investigações anteriores de Galileu, entre outros, existe um contraste claro entre movimentos inerciais e não inerciais. Os movimentos inerciais são os movimentos de um objecto com uma velocidade constante, isto é, de um objecto que se move a uma velocidade imutável e numa direcção fixa. Ora, para um relacionista, noções como as de "velocidade imutável" e "direcção fixa" só podem ser entendidas em relação a um quadro de referência estabelecido por alguns objectos materiais. Algo que está em repouso em relação à superfície da Terra, por exemplo, está em movimento rápido e a mudar constantemente de direcção em relação a um quadro de referência localizado, digamos, no Sol. Mas, defende Newton, a noção de movimento não inercial não é a de um movimento "meramente relativo", mas a de um movimento "absoluto".
Porquê? Os movimentos não inerciais geram "forças" que se revelam em efeitos demonstráveis. A água de um balde que descreve movimentos rotativos transborda. (…)
Encontramos assim em Newton a introdução de um novo elemento no velho debate filosófico entre aqueles que consideram o espaço e o tempo como constituintes autónomos do mundo, e aqueles que os consideram simplesmente como compêndios de colecções de relações entre as coisas fundamentais do mundo: os objectos materiais e as suas mudanças. Para o newtoniano, o espaço e o tempo são elementos teóricos postulados, cuja existência tem de se pressupor para poder explicar os fenómenos a que temos acesso ao nível experimental e observacional. (…)
No século XIX, o físico e filósofo Ernst Mach tentou, uma vez mais, conciliar os resultados da física newtoniana com a abordagem relacionista do espaço e do tempo. Mach chamou a atenção para o importante facto de que a taxa de rotação da Terra, determinada pela observação das estrelas fixas, é a mesma que a taxa absoluta de rotação da Terra, determinada por experiências puramente mecânicas baseadas nas forças geradas pela rotação. Poderia isto sugerir uma origem das forças inerciais que Newton não tivesse imaginado? Suponhamos que a aceleração de um objecto material em relação a outro produz forças, tal como a velocidade relativa de duas partículas electricamente carregadas produz uma interacção magnética. Suponhamos que tal força é independente da separação dos objectos (num grau elevado), mas dependente das suas massas. Não poderão as forças geradas por acelerações, que Newton atribuía à interacção causal do objecto experimental com o espaço em si, ser antes atribuídas à aceleração relativa do objecto experimental em relação às estrelas fixas, ou, mais propriamente, em relação à média da restante matéria "espalhada" pelo universo? Se assim for, não poderemos reconciliar os factos observacionais que Newton usou para argumentar a favor da existência de um tipo de espaço substantivo com um relacionismo leibniziano que considerasse todas as posições, velocidades e acelerações como características de uma coisa material em relação a outra?
(…) No final do século XIX, a situação era assim mais ou menos a seguinte: todos concordavam que existiam duas amplas dimensões da realidade — todas as coisas materiais existiam no espaço, e todos os acontecimentos, materiais ou mentais, decorriam no tempo. A estrutura destes palcos do mundo era conhecida. O tempo podia ser concebido como um simples contínuo unidimensional. O espaço era uma estrutura tridimensional, descrita pela conhecida geometria euclidiana. Parecia que podíamos conhecer esta estrutura inferindo-a de primeiros princípios cuja verdade era, num certo sentido, indisputável, isto é, cuja verdade podia ser conhecida por uma pessoa racional por meio de um tipo qualquer de razão pura. De um ponto de vista filosófico, a natureza destes contentores de todas as coisas e acontecimentos não era clara. Os substantivistas de inspiração newtoniana rivalizavam com os relacionistas que seguiam as ideias de Leibniz. Outros defendiam concepções metafísicas diferentes. Kant, por exemplo, pensava que o espaço e o tempo eram estruturas organizadoras da mente, por meio das quais dávamos às sensações um formato compreensível.
Ao passo que a aceleração em relação ao espaço em si tinha consequências observáveis, a posição no espaço em si e a velocidade uniforme em relação ao espaço em si não tinham tais consequências. Mas existia a esperança de que, por meio de fenómenos ópticos, se pudesse determinar o estado de repouso no espaço em si. A tentativa de determinar o estado de repouso em relação ao espaço em si por meio de experiências com a luz foi o que conduziu, graças ao trabalho do grande físico Albert Einstein, às espantosas revisões das nossas ideias de espaço e de tempo. A possibilidade de novas ideias puramente filosóficas sobre a natureza do espaço e do tempo já existia antes do seu trabalho, mas foi à luz dos resultados de Einstein e das penetrantes ideias por eles proporcionadas que se explorou a maior parte da filosofia contemporânea do espaço e do tempo. Em "Do espaço e do tempo ao espaço-tempo" e em "A gravidade e a curvatura do espaço-tempo", esquematizarei as novas teorias sobre o espaço e o tempo propostas por Einstein, regressando depois à filosofia do espaço e do tempo no contexto dessas novas teorias físicas. -- Lawrence Sklar, Universidade de Michigan.
De facto os grandes equívocos da Física resultam dos tropeções que esta dá nos seus conceitos. No entanto, a respeito do espaço e do tempo os tropeços podem resultar em quedas fatais.
Obviamente que as questões do espaço e to tempo são mais metafísicas do que físicas. Mas, se O ser é Deus e eterno não tem espaço nem tempo logo foi sempre vã a tentativa de querer atribuir razões teológicas às ideias de espaço e de tempo porque na verdade ambas as ideias serão sempre aproximações humana e finitas à natureza una e eterna, imutável e infinita do Ser. Razão tem por isso Kant, que magistralmente colocou a metafísica de lado como de resolução impossível no mundo sensível da ciência experimental, em afirmar contra Newton e Leibniz que nem um nem outro tem razões nos seus pontos de vista metafísicos porque o espaço e o tempo não são dessa natureza por serem tão só e apenas uma condição essencial do nosso entendimento, ou seja, um fundamento formal da epistemologia.
Todos nos damos conta de que a querela entre Newton e Leibniz a respeito do espaço e do tempo se baseou em equívocos metafísicos forçados por ambos os contendores porque ambos estavam inconscientemente mais interessados no desentendimento do que no consenso porque tinham uma querela pessoal por resolver a respeito da paternidade do cálculo diferencial. Felizmente para Newton, que acabou por levar a melhor, o treino filosófico que este tinha tido para refutar a física de Descartes facilitou-lhe o trabalho, até porque o relacionismo de Leibniz era uma variante do racionalismo cartesiana onde a rex extensa não diferia muito da teoria esotérica das mónadas que desacreditaram para sempre a seriedade da física tanto de Descartes como de Leibniz. Mas tinha Newton verdadeiramente razão na sua questão do espaço absoluto? Obviamente que não porque o espaço absoluto tresanda à alquimia metafísica que arruinou a saúde do físico...mas não a física newtoniana.
A conclusão é de que é impossível conhecer os objetos externos sem ordená-los em uma forma espacial - e de que nossa percepção interna destes mesmos objetos fica impossível sem uma forma temporal.
Além disso, espaço e tempo preexistem como faculdades do sujeito - e, portanto, são a priori e universais - quando eliminamos os objetos da experiência. Por isso, segundo Kant, espaço e tempo são atributos do sujeito e condições de possibilidade de qualquer experiência. (...)
Chegamos, portanto, a uma síntese que Kant faz entre racionalismo e empirismo. Sem o conteúdo da experiência, dados na intuição, os pensamentos são vazios de mundo (racionalismo); por outro lado, sem os conceitos, eles não têm nenhum sentido para nós (empirismo). Ou, nas palavras de Kant: "Sem sensibilidade nenhum objeto nos seria dado, e sem entendimento nenhum seria pensado. Pensamentos sem conteúdo são vazios, intuições sem conceitos são cegas."
Considerações finais É um lugar-comum dizer que Kant é um divisor de águas na filosofia, mas é verdade. O sistema kantiano foi contestado pelos filósofos posteriores. No entanto, suas teorias estão na raiz das principais correntes da filosofia moderna, da fenomenologia e existencialismo à filosofia analítica e pragmatismo. -- Kant - teoria do conhecimento: A síntese entre racionalismo e empirismo, José Renato Salatiel, Especial para a Página 3 Pedagogia & Comunicação.
Desde Aristóteles que sabemos que as tentações antitéticas da gnosiologia se ultrapassam apenas por uma qualquer forma de realismo que seja o meio caminho possível entre a dualidade dos opostos metafísicos sendo por isso suspeito de falsidade qualquer sistema que tenda a ser dogmático e absoluto mesmo confessando-se relativista como foi o caso de Galileu e modernamente de Einstein. A dificuldade em ultrapassar a natureza dual da luz reside em grande parte nesta herança pós revolucionária de recusar os compromissos realistas que a razão e o bom senso sempre impõem em épocas de boa paz social.
El conjunto de ecuaciones (1.3) se denominan ecuaciones de la transformación Galileana o, simplemente, transformación de Galileo. Hemos añadido t = t para enfatizar que estamos suponiendo que el tiempo transcurre igual para ambos observadores; es decir, que las medidas del tiempo son independientes del movimiento de cada observador. Esto es algo que está muy de acuerdo con el sentido común, pero que es sólo una suposi-ción que puede ser desechada de forma experimental.
Como veremos a respeito das forças fictícias o que existe precisamente de mais inaceitável na física clássica é precisamente a questão das transformações de Galileu.
Embora as transformações sejam nomeadas em homenagem a Galileu, é o conceito de tempo e espaço absolutos como concebido por Isaac Newton que fornece seu domínio de definição. Em essência, as transformações de Galileu incorporam a noção intuitiva de adição e subtração de velocidades como vetores.
No entanto é um erro pensar que pelo simples facto de se poderem adicionar formalmente velocidades vectoriais se possa multiplicar a velocidade de um corpo ou de um fenómeno por simples somatório de corpos movidos em plataforma sobrepostas de progressivas velocidades. Se assim fosse os extremos de disco de vinil sobrepostos ou de longo raio acabariam por se desintegrar ao atingirem velocidades tendencialmente infinitas.
A adição de velocidades é intuitiva e válida no compito final de um acontecimento na situação fisicamente possível de corpos em movimento em plataformas móveis, como é o caso da subida de escadas rolantes a correr ou de um barco a motor num rio caudaloso e veloz. No entanto seria um abuso pensar que a velocidade real do móvel movido corresponda à soma da sua velocidade própria acrescida da velocidade que lhe foi transmitida a não ser quando se der a separação dos dois corpos. Dito de outro modo, a soma de velocidades só é efectiva quando os móveis se separam. Em rigor nestas situações há apenas transmissão de quantidade de movimento cujo resultado final é uma aceleração que o móvel transportado se for um observador sensível virá a sentir como força fictícia quando parar o móvel transportador ou aquele abandonar este.
As velocidades sobrepostas resultantes de somas vectoriais são sempre relativas e só a velocidade própria de um corpo pode ser considerada como sendo uma velocidade absoluta.
Transportando esta realidade para a luz e para o som verificamos que não pode haver soma de velocidades porque tal iria contraria o seu comportamento ondulatório descrito de acordo com o efeito Doppler que confirma a invariância das velocidades das ondas para todos os referenciais de inércia precisamente pelo seu carácter ondulatório. Assim, não se compreende que Einstein tenha estranhado o facto de as leis do electromagnetismo de Maxwell não cumprissem as transformações de Galileu porque cumpriam com o previsto no efeito Doppler.
O mais absurdo desta situação é ter-se posteriormente criado o conceito de “efeito Doppler relativístico” postulando a estranha expansão do universo:
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[1] Uma conversa de Pedro Mexia com o histórico realizador, publicada no Expresso em 2013.
[2] http://dominiodasletras.spaceblog.com.br/1295531/Clacissismo/
[3] Nada está no intelecto que não tenha estado primeiro nos sentidos.