sábado, 17 de maio de 2014

HABEO ou A ETIMOLOGIA DO SER E DO TER, por Artur Felisberto (arturjotaef)

Supomos ter encontrado o étimo duma série de verbos com a significação de "haver” nos domínios grego, latino e germânico.

E' certo que várias etimologias têm sido propostas para os explicar, mas essas etimologias estão sujeitas a graves objecções e sofrem do defeito de separarem verbos que, pela identidade de sentido e de função, procedem evidentemente da mesma origem.

Uma etimologia que reunisse todos esses verbos, cingindo-se às possibilidades fonéticas, ofereceria, sem dúvida, grandes verosimilhanças.

E' uma hipótese com essas aspirações que o leitor vai ler e julgar.

O verbo "haver” tem o seu quê de misterioso. Parece que em sânscrito se deveria encontrar verbo semelhante na forma e no sentido, paralelo aos que correm pela Europa, e não se encontra; parece também que a comunidade de origem do lat. habeo e do got. haban, p. ex., deveria estar fora de discussão, e no entanto não está: a Lei de Grimm protesta; finalmente, o lat. habeo e o grego ecw, estão foneticamente (supõe-se) separados por um abismo, e todavia ambos têem o mesmo sentido e assumem identicamente, por vexes, as funções de auxiliares.

Mas ainda outra singularidade nos apresenta esse verbo extranho.

Disfarça-se tão bem, quando aglutinado a outro verbo, que, para ser descoberto, é quási preciso génio, e, ainda quando descoberto, persistem disputas acerca da sua identidade. Lembremo-nos o que sucedeu com a descoberta do humanista espanhol António de Nebrissa, da formação do futuro românico e das dificuldades que houve na adopção das suas ideias (1).

Quando já era admitida por todos a teoria da formação do futuro e do condicional, surge o sábio e fantasista autor da "Fascinação de Gulfi", o célebre Bergmann, sustentando que tal doutrina não era verdadeira, que nem futuros nem condicionais tinham a origem que se lhes atribuía, mas sim que provinham do futuro perfeito latino (2).

O mesmo sucede com o perfeito do verbo espanhol andar que evidentemente é formado com o verbo haber. Há no entanto quem se recuse a ver aí esse verbo (3).

Esta propriedade de tão bem se ocultar o verbo "haver” é certamente a causa de não ter sido encontrada a sua etimologia nem o seu correspondente em sânscrito. --

(1) Adolfo Coelho —Teoria da Conjugação em latim e português, 1870, pag. 116.

(2) Bergmman — Cours de Linguistique, etc. Paris, 1876, pág. 222.

(3) P. ex. Commerlan y Gomez —Grammatica-Comparada de las lenguas Castelana y Latina, Madrid, 1889, pag. 153. (…)

Supomos ter encontrado o étimo duma série de verbos com a significação de "haver” nos domínios grego, latino e germânico.

E' certo que várias etimologias têm sido propostas para os explicar, mas essas etimologias estão sujeitas a graves objecções e sofrem do defeito de separarem verbos que, pela identidade de sentido e de função, procedem evidentemente da mesma origem.

Uma etimologia que reunisse todos esses verbos, cingindo-se às possibilidades fonéticas, ofereceria, sem dúvida, grandes verosimilhanças.

E' uma hipótese com essas aspirações que o leitor vai ler e julgar.

O verbo "haver” tem o seu quê de misterioso. Parece que em sânscrito se deveria encontrar verbo semelhante na forma e no sentido, paralelo aos que correm pela Europa, e não se encontra; parece também que a comunidade de origem do lat. habeo e do got. haban, p. ex., deveria estar fora de discussão, e no entanto não está: a lei de Grirmm protesta; finalmente, o lat. habeo e o grego ecw, estão foneticamente (supõe-se) separados por um abismo, e todavia ambos têm o mesmo sentido e assumem identicamente, por vexes, as funções de auxiliares. (…)

Em sânscrito o verbo bhu "ser” tem, além de "ser”, "existir, produzir, pertencer, nascer” etc., também a significação de "obter" (5) bem vizinha de ter, haver.(…)

O verbo bhu sânscrito, oriundo de bheu, tinha conjugação completa, mantendo o sentido de "ser” como já vimos. Estudemos, pois, as formas que toma em indo-iraniano esse verbo, no presente, p. ex. (omitimos o dual):

Sânscrito

Zend

SINGULAR

bhávâmi

bavâmi

bhávasi

bávahi

bhávati

bavaiti

PLURAL

bhavâmas

bavâmi

bhávata

bavata

bhávanti

bavainti

   A semelhança das formas nas duas línguas é flagrante.

Imaginemos por um momento (o que, de resto não é legítimo) as formas sânscritas sem h. Então a semelhança com as de habeo, de haben etc., seriam notáveis? Simples acaso? A conveniência semântica, já a procuramos demonstrar. A questão fonética, a mais grave, será o assunto do nosso próximo artigo nesta revista.

Matosinhos, Maio de 1920. josé teixeira rego. Estudos de Glotologia indo-europeia, UMA NOVA ETIMOLOGIA DUM VERBO.

Faz pouco sentido ser tímido em comparar o foneticamente subtil verbo sânscrito bhu (ainda para mais suposto oriundo de *bheu, sabe-se lá com que real fonética falado) com o latino habeo só porque um significa “ser” e outro “ter” quando conjugação completa do mesmo verbo em sânscrito e em Zend ressoam naturalmente à musicalidade das flexões do verbo habeo.

Un falso cognado es una palabra que, debido a similitudes fortuitas de apariencia y significado, parece guardar parentesco con otra palabra de un idioma diferente, pero que en realidad no comparte su mismo origen etimológico (no son verdaderos cognados). El ejemplo típico es el del verbo inglés to have (tener, haber) y el similar verbo español haber, los cuales, pese a sus semejanzas aparentemente obvias, en realidad provienen de raíces proto-indoeuropeas bien distintas: el inglés to have proviene de *kap- (agarrar), y en realidad está emparentado con nuestro verbo captar, aunque no lo parezca; mientras que nuestro haber proviene de la raíz proto-indoeuropea *ghabh- (dar), y aunque tampoco lo parezca, está emparentado con el inglés to give (dar).

Así, por ejemplo, si nos basamos en similitudes superficiales, podríamos suponer que el verbo latino habere y el alemán haben, que significan tener, son cognados, pero no es así. (…) haben proviene en realidad del proto-indoeuropeo *kap (agarrar), y su cognado real en latín es capere (tomar, capturar). El verbo latino habere, en cambio, deriva del proto-indoeuropeo *ghabh (dar, recibir), por lo que es el cognado de la palabra alemana geben.

Não posso! Não consigo! É demais!!! Apetece gritar: Fora com estes académicos pedantes duma figa!

Mas já alguém leu em algum lado o que quer que fosse de proto-indoeuropeu já que seguramente ninguém ouviu sequer nenhuma das muitas línguas mortes que ainda são legíveis. O pior é que o proto-indoeuropeu nem sequer pode ser considerado como sendo uma língua porque nem morta é! O proto-indoeuropeu é apenas uma quimera e logo um mito que pode ser monstruoso se nos obriga ao descaramento de acreditar que o branco é preto…e quem dá não deixa de ter! Claro que para ter é preciso agarrar e «captar» mas, francamente se ninguém dá o que não tem também é verdade que “quem dá e tira vai para o inferno”!!!

O.E. habban "to own, possess; be subject to, experience," from P. Gmc. *haben- (cf. O.N. hafa, O.S. hebbjan, O.Fris. habba, Ger. haben, Goth. haban "to have"), from PIE *kap- "to grasp" (see capable). Not related to L. habere, despite similarity in form and sense; the Latin cognate is capere "seize." (…) Related: Capably ó capaz del Lat. tard. capabilis "receptivo," usado por los teólogos de Lat. capax "capaz de contener mucho" forma adj. de capere "to take, grasp, lay hold, catch, undertake, be large enough for, comprehend," from PIE *kap- "to grasp" (cf. Skt. kapati "two handfuls;" Gk. kaptein "to swallow, gulp down;" Lett. kampiu "seize;" O.Ir. cacht "servant-girl," lit. "captive;" Welsh caeth "captive, slave;" Goth. haban "have, hold;" O.E. hæft "handle," habban "to have, hold;" see have).

To keep < late O.E. cepan "to seize, hold," also "to observe," from P. Gmc. *kopijanan, but with no certain connection to other languages. It possibly is related to O.E. capian "to look," from P. Gmc. *kap- (cepan was used c.1000 to render L. observare), which would make the basic sense "to keep an eye on." (???)

Em fonética histórica, dá-se o nome de Lei de Grimm a uma tendência fonética nas línguas germânicas, descoberta em 1822 e descrita em detalhes por Jacob Grimm (autor, junto com seu irmão Wilhelm, dos famosos contos dos irmãos Grimm). A lei explica as variações que sofreram várias consoantes indo-européias, por uma mutação acontecida no período pré-histórico da evolução das línguas germânicas: as consoantes aspiradas do indo-europeu, [bh, dh, gh], tornaram-se não aspiradas, [b, d, g]; as sonoras, [b, d, g] tornaram-se surdas, [p, t, k]; as surdas fixaram-se aspiradas, [f, ?, h].

Como é mais do que evidente desde que não se esteja obcecado pela mitologia indo-europeia ou pelo mero preconceito académico mais facilmente se aceita que seja to keep que deriva de PIE *kap- já que não se nega que passa derivar do P. Gmc. *kap. E não há-de poder porque?

A Lei de Grimm:

1º Só é inteiramente válida no contexto das línguas germânicas onde tem tantas excepções que foi completada pela lei de Verner que deve contar ainda com muitas excepções porque é duvidoso que as línguas sigam rigidamente leis fonéticas quase sempre impostas pelos gramáticos e não pelos falantes que apenas seguem regras muito gerais onde quotidianamente nascem excepções que as confirmam.

2º Corresponde a um fenómeno recente em torno do século primeiro antes de Cristo, altura em que as línguas germânicas ainda estavam em fase pré-histórica e o latim já se encontrava estabilizado por escrito tal como muito mais e sobretudo o grego e as línguas indo-arianas.

3º Assim, muitos termos latinos podem ter-se encontrado com o mesmo antepassado comum do P. Gmc.

De resto, a confusão entre PIE e P. Gmc. é mais do que patente e denota um preconceito pan germanista mal disfarçado! Mas sendo aceite que o latim é indo-europeu o que impede de aceitar que o tão teórico quanto inefável e difuso PIE *kap- não tenha sido a fonte semântica directa tanto do inglês to keep, que assim se revela um insólito e isolado arcaísmo, quanto do latino capere que pode ter induzido à manutenção do arcaismo?

Do mesmo modo, o que impede o latino havere de ter derivado do PIE *kap- em época anterior ao século primeiro antes de Cristo contemporânea do P. Gmc. *haben-?

Pelo menos evitar-se-ia sem dor nem stress ter que aceitar o puro disparate de que nuestro haber proviene de la raíz proto-indoeuropea *ghabh- (dar), y aunque tampoco lo parezca, está emparentado con el inglés to give (dar).

Mas a verdade é que «haver» nem parece na forma gráfica nem fonética e muito menos na semântica pelo que só por equívoca teimosia se pode aceitar que o latino habeo tenha alguma coisa a ver com inefável raíz proto-indoeuropea *ghabh- com a qual o verbo inglês pode ter tudo mas com a qual o verbo latino habeo nada tem de semelhante. Por outro lado, mesmo que os pedantes académicos digam o contrário até à exaustão por equívoco seguidista de algum catedrático com Alzeimer, to keep é o verdadeiro cognato de todos os derivados directos do *PIE *kap- e todas as falas indo-europeias com a raiz em *hab- são também possivelmente cognatas entre si!

«Capaz» = Lat. capace < Lat. capere > «caber».

                                                           > «capar» ó «escapar» Lat. * excappure, tirar a capa??? Para quê fugir à inevitabilidade da captura?

«Captar» < Lat. captare / Lat. captura < Lat. captivus, de captus, participio passado de capere “tomar, atrapar”.

A linguística tradicional trata as matérias da língua com paninhos de renda porque, como é óbvio, a tirania de mestre-escola assim obriga. As línguas são sagradas e tocar nas ideias feitas a seu respeito é tabu como é pecado de lesa majestade vitoriana por em causa a teoria indo-europeia.

Ora esta é uma invenção tipicamente facista feita com a intenção subliminar de explicar a semelhança dos sânscrito, muito mais arcaico do que as línguas ocidentais, com o inglês, sem por em causa a superioridade cultural dos colonizadores.

É óbvia a relação Sânscrito bhá vâmi ó Zend ba-vâmi bastando deixar cair o h que muitas vezes emudece. Mas neste caso quem perdeu na fala foram os apressados escritores em zendi! De facto, nem sequer parece ser preciso não deixar cair para passar do sânscrito (literalmente, a “escrita santa”) ao latim.

Afirmar que a origem indo-europeia virtual fosse *bheu- é duvidoso. Na verdade, a análise da declinação referida antes do verbo sânscrito bhu permite a raiz significante bhá- que em latim trerá passado a ser hab- sem que tenha afinal sido preciso queda alguma de som significante.

Na verdade habeo e seguramente uma forma composta hab-eo, literalmente “eu hei”. Claro que no português resultou uma aglutinação difícil de explicar foneticamente sem um estudo das formas arcaicas e medievais deste verbo mas é evidente que sempre existiu a consciência subliminar nos falantes de que a raiz significante deste verbo era monossílaba e que o -eo seria apenas o pronome pessoal. Quase que se pode apostar que o latino hab- > haw (espan. /german. hago) > hau, que por aliteração com eo, ou com a forma autóctone do verbo equivalente, deu em galaico-português, hei.

A etimologia do Gr. ecw é complexa e controversa, dizem os gramáticos.

Com relação a ecw supôs Bopp que esse verbo derivasse da raiz vah transportar, alegando que esse sentido de transporte ainda aparece claramente no composto anecw, etc., e explicava o sentido de "haver” pelo facto de a raiz vah ter também o significado de “levar”, pelo que se chegaria facil­mente, diz o excelso pensador, ao de possuir. As dificuldades de formas como as do aoristo sceino, resolvia-as invocando a intervenção de duas raízes na formação dos tempos desse verbo, a saber ec de vah e sce  de sah. -- Estudos de Glotologia indo-europeia, Matosinhos, Maio de 1920. josé teixeira rego.

Existem indícios fonéticos que parecem correlacionar o missénico com os modernos falares ibéricos o que pode ter resultado da forma como as línguas francas neolíticas se espalharam pelo extremo peninsular pela mão dos minóicos. Deste modo, a controvérsia linguística constatada só poderia ser esclarecida se tivéssemos acesso completo à língua missénica, ao linear-a da língua minóica e às antigas línguas ibéricas. Até lá fiquemo-nos pela verosimilhança, que uma vez postulada parece resolver a questão!

Gr. ecw < Missénico. *Hejo < Ibérico. *Haj-o

ó Prot. Germ. eig- / hab- / hafj- <> Letão. būt

Arabic:

يَمْلك

Latvian:

būt (piederības nozīmē)

Czech:

mít

Lithuanian:

turëti

Danish:

have

Norwegian:

ha, eie

Dutch:

heb-ben, bezitten

Polish:

mieć, posiadać

Estonian:

olema, omama

Portuguese

haver, ter <?> caber

French:

avoir

Romanian:

a avea

German:

haben

Russian:

иметь

Greek:

έχω

Slovak:

mať

Hungarian:

van (vkinek vmije)

Slovenian:

imeti

Icelandic:

vera með; eiga

Spanish:

haber, tener, poseer

Indonesian:

mempunyai

Swedish:

ha, inneha

Italian:

avere

Turkish:

sahip olmak, var

Gr. ecw < Missénico. *Hejo < Ibérico. *Haj-o ó Prot. Germ. eig- / hab- / hafj-

                                                                                > «acho» => «faço, vejo»?

Pela análise sumária das várias formas de expressar o conceito de «ter e haver» nas línguas mais comuns verificamos que a origem indo-europeia das línguas modernas ocidentais está longe de ser universal. Na verdade as línguas eslávicas parecem estar mais a dever o que têm aos transcaucasianos do que aos indo-europeus pois têm apenas semelhanças com o turco. Mas, a verdade é que o conceito de ter enquanto posse tem uma relação semântica muito forte com a realidade concreta da instabilidade da posse que só existe enquanto se pode segura-la e defende-la dai decorrendo as múltiplas variantes semânticas que se podem encontrar para este verbo. De qualquer modo, não deixa de espantar que o rasto linguístico do haver se estenda com uma certa regularidade e nitidez ao longo da costa ocidental da Europa o que recoloca a origem minóica destas culturas, seguramente revisitadas pelos fenícios.

E é então que deparamos com o facto, que deveria ter pouco de espantoso, de ter que aceitar que verbos tão genéricos e metafísicos como “ser e haver” terão andado com semânticas tanto mais imprecisas e vagas quanto mais primitivas foram as línguas e, obviamente as culturas e as civilizações que as falaram. Atrapalhar-se com a clareza e riqueza semântica de línguas altamente trabalhadas por gramáticos e filósofos com os falares populares, que necessariamente seriam as línguas primitivas, a cair sempre no mesmo preconceito de pensar que as línguas surgiram da boca dos deuses já perfeitas e acabadas quando afinal nem o Géneses pretende tanto ao ter postulado o mito de que Deus deu a Adão o poder de nomear as coisas. É certo que logo a seguir se caiu na tentação do verbo divino, encarnado a partir do “om” universal num corpo linguístico perfeito e acabado, postulando a confusão das línguas com a queda da torre de Babel mas a verdade é que as línguas seguiram forçosamente o percurso da historia humana universal pelo que não faz sentido pensar a língua esquecendo os falantes e sobretudo as vicissitudes da sua história.

Se é sabido que em hebraico o verbo “haver” não existe e é substituído pelo dativo precedido do verbo "hajah” (= ser..étc.) um gramático de língua lusa tem mesmo que tropeçar no “haja Deus” dos judeus e mandar as teorias arianas às malvas se quiser continuar em frente no esclarecimento da verdade linguística. É obvio que a fonética portuguesa do verbo haver deve mais ao "hajah” judaico do que ao latim precisamente porque antes dos romanos andaram por cá os fenícios e cartagineses com tanta ou mais cultura que a dos romanos não sendo por isso necessário sequer invocar em vão o nome do povo de Deus. Já em espanhol “haver” tem a semântica de “fazer”, porque, de facto, numa economia minimalista normalmente só se tem o que se faz! Mas é bom lembrar que também o verbo «ser» pode em muitos casos ter que ser clarificado com o verbo «estar» pois quem não está ou não existe ou não é…para aqui chamado!

De resto a conversão da voz passiva em voz activa é tão intuitiva que até os alunos cábulas lá chegam! O que nunca ninguém nos tinha ensinado é que no princípio era o verbo na voz passiva…Mas tantos preconceitos que os mestres escolas nos ensinaram por ignorância, santo Deus!

E nem sequer é preciso recorrer à voz passiva para passar do ser ao ter!

Diz-se que em árabe o verbo "haver” é substituído por "ser” com dativo em expressões como "eu tenho (hei) duas casas” = “Andi zandj diar

= sou (dono) de duas casas = são minhas duas casas, etc, pois seria ridículo dizer “duas casas são tidas por mim”!!!

É bom dar conta que os verbos auxiliares servem para isso mesmo, ou seja, como coadjuvantes genéricos, moduladores da função verbal específica dos verbos objectivos. Ora se o “ser” é o mais genérico dos verbos, o ser abstracto precedeu a existência até ao existencialismo mas começou a perder pertinência ideológica precisamente com o começo do helenismo. Assim, é muito possível que tenham sido os romanos os primeiros a enfatizarem o papel auxiliar do ser existencial com o verbo habeo que acabou por se desdobrar em português em dois verbos equivalentes, o verbo «haver» com flexões eruditas latinas e algumas populares ainda próximas do ser semítico, e o verbo «ter» na medida em que o poder de ser e existir dependia na economia feudal da força do que se tinha. E do ser ao devir pelo “ter que ser” se chega ao conceito ético do “dever” e, por isso ao papel que os verbos com esta semântica compulsiva têm como auxiliares de futuro condicionado!

Ora bem, só mero e puro anti-semitismo estulto não repara que o hebreu "hajah" é desta família! Separar as línguas indo-europeias das semitas é puro disparate, a não ser para dar conta que as indo-europeias seriam meros crioulos das línguas acádicas e semitas, muito mais arcaicas e elaboradas.

Então, seria preciso saber a origem de haj-ah < Lat. Af-flare), v. tr. encontrar > «achar» ó ecw.

Hab-< eig- / hab- / hafj- < *Hawj- < ??? A partir daqui os linguistas terão de procurar nas arcaicas línguas, semitas, acádicas (aramaicas e sumérias), coptas e egípcias etc. as pistas para a semânticas do ser e do ter. Na verdade, na origem da cultura as coisas eram de quem as tinha e só tinha algo quem era alguém! A separação deve ter começado na filosofia grega e com o «ego» dos gramáticos que passaram do hab- ao hah-eo por hab-ego quiçá por ressonância redundante com ecw.

Quem sabe mesmo se o “ser” latino resultou apenas do “não ter” de quem quer ter, ou seja, comprar?

Sumer: sám, šám, sa: = (troca) compra; preço; mercadoria; comprar, venda.

No entanto, parece não ser verdade que os sumérios não soubessem distinguir o ser do terem, pois sabiam até separar o ter do não ter.

Possivelmente os sumérios nem usariam muito o verbo ter, pois os poucos que tinham algo guardavam-no dos indiscretos! Na verdade, toda a cultura semita, patente na sabedoria bíblica do livro de Job, estava amargamente ciente da precariedade do ter! Por outro lado, o ter sumério estava relacionado com o poder entendido como intrinsecamente instável pois começava no acaso do achar e acabava feito em cacos.

O sum latino nada tem a ver com to be inglês e do eimi grego apenas tem o m!

Be = O.E. beon, beom, bion "be, exist, come to be, become," from P.Gmc. *beo-, *beu-. Roger Lass ("Old English") describes the verb as "a collection of semantically related paradigm fragments," while Weekley calls it "an accidental conglomeration from the different Old English dial[ect]s." It is the most irregular verb in Mod.E. and the most common. (…) The "b-root" is from PIE base *bheu-, *bhu- "grow, come into being, become,"and in addition to Eng. it yielded Ger. present first and second person sing. (bin, bist, from O.H.G. bim "I am," bist "thou art"), L. perf. tenses of esse (fui "I was," etc.), O.C.S. byti "be," Gk. phu- "become," O.Ir. bi'u "I am”, Lith. bu'ti "to be”, Rus. byt' "to be”, etc. It is also behind Skt. bhavah "becoming," bhavati "becomes, happens," bhumih "earth, world."

O mesmo se passa com as flexões do sum latino e do verbo ser português! Isto significa que estes verbos genéricos se sedimentaram a partir de variantes de dialectos populares de conotações diversas de acordo com a sua frequência nos falares comuns. As línguas latinas perderam estas flexões em b do verbo ser porque já as tinham gasto no verbo haver de habeo. No entanto ressonâncias arcaicas podem ser encontradas em verbos tais como o prov. «botar» (pôr, impelir) ou na forma contracção verbal do latino videre em «ver»!

No entanto o mundo sânscrito bhumih nada tem a ver com bhavati que tudo tem a ver com o latino habet.

O verbo foneticamente mais próximo do sum latino é o Sumer: sám, šám, sa = (troca) compra; preço; mercadoria; comprar, vender.

Os sumérios, bem mais práticos do que os acádicos em matéria de ser e ter, terão usado o verbo ser com a conotação do habeo latino.

Tentando uma etimologia artificial e especulativa para habeo teríamos:

Lat. Hab-eo < *bheu- > *bhu- < W*ku (> ecw < Eco) < Caco, deus do fogo e esposo de Caca ou *Ki-ash / Hebat / Hekate / Hebe / Eva.

Na verdade, na origem da cultura “as coisas eram de quem as tinha e só tinha algo quem era alguém com poder”!

Sumer: Ba-Su = ser. Sumer: Nu = não ser.

Sumer: Nu-A = não ter. ó Pad = ter??? = fazer em pedaços, esmigalhar = Descobrir = Achar; Pa-Pil-Sak = Grande fogo (Leo); Pa-Pil-Sak = Ceptro; Pat-esi = o Governador.

A separação drástica entre o «ter e o ser», que sempre esteve ligada pelo existir e haver, deve ter começado na filosofia grega e com o «ego» dos gramáticos!

De qualquer modo, é flagrante a relação fonética do pad sumério com a raiz indo-europeia de pai e do latino pot- e da grega pos-, raiz que passou incólume na península para o termo paternalista e patriarcal, «padre», ou “pai de quem tem o poder de ter”!

Também quase inalterável foi a passagem do Sumer: Nu (= não ser) / Nu-A (= não ter) pela ideia da «nu-lidade da nu-dez».

Ba-Su, deus do ser que pode ter sido Bês ou Dionísio Bassareu, deveria ter alguma antinomia com Nu, deus do não ser do Caos primitivo que foi o egípcio Nun!

Nun (também conhecido como Nu ou Ny) é o necter egípcio sem sexo que é o líquido cósmico que deu origem ao universo. É o ser subjetivo, quando se transforma no ser objetivo, torna-se Atum.

El término Nun es el utilizado en el periodo tardío, mientras que más arcaicamente se utilizaba Nuu. En el principio, antes de la creación, sólo hay Nun (pero «no existe»), es un océano inerte, sin límites, rodeado de absoluta oscuridad, que no es la noche, pues aún no se había creado esta. Los sacerdotes egipcios, para describir este estado, enumeraban lo que no existía.

As formas mais primevas de linguagem seriam parecidas naturalmente com as formas mais primitivas da linguagem infantil: de tipo gestual, mimético, e foneticamente guturais, interjectivas e silábicas!

Inicialmente Nu / Anu / Nu-Nu seria o deus invisível do céu e das fontes de água doce primordial. Assim, mais do que não ser, Nu ou Nuno significaria quase o mesmo do que hoje significa em português: o que esta despido como os deuses do céu e, por isso, não tem nada de corpóreo por ser um puro sopro invisível, um “ar que se lhe deu”, um espírito incorpóreo invisível a olho nu, um puro nada!

Nu-A, a forma infantil de dizer: «não há» é literalmente em sumério “água no céu” e, semanticamente, algo como: “não há á-gua, evaporou-se, sumiu”!

Seria mesmo ausência tal de ser que nem uma pinga ou migalha de coisa alguma deste deus se veria, em tempo de seca e carestia, ou sobretudo de noite se caso se tratasse dum deus solar. Na verdade este deus era a forma nocturna de Enki, no Abzu, deus ocioso e antigo, velho, obeso e barbudo, distante e ausente, senhor descido aos infernos do Kur durante o inverno e depois do sol-posto.

A esta forma hermética e negativo dum deus morto e dos mortos, representado no Egipto como uma múmia, deus negro, verde ou azul já no fim da linha da vida se opunha o “deus menino” da aurora que em casos extremos de compromisso formal seria representado como adulto acriançado, como foi o caso de Bês ou Ba-Su.

 

Ver: BASSAREU (***)

 

Mas como foi com o casal divino Caco/ Caca que tudo começou, a kašbir por estes inventada para gáudio e sustento do povo neolítico, pode ter sido o eco arcaico dum mero delírio efémero de bebedeira mal curtida!

Assim, até que alguém encontre a resposta certa linguisticamente documentada pode propor-se o atalho seguinte para a origem do «haver».

Ba-Su < *Wiashu < Kawish > *Hawj- < Kawish

ó kašbir => «caber» < lat, capere, compreender > Lat. sapere.

Obviamente que muitos verbos genéricos terão surgido colateralmente ao habeo da mesma fonte semântica como «saber», «caber», ou mesmo «achar e fazer», etc. Notar a relação latente entre hav-er e hab-itar! As raízes linguísticas manifestadas pelas línguas modernas são construções de gramáticos que se limitaram a padronizar formas de falar muito diversas mas que na origem estiveram relacionadas com os cultos aos deuses. Assim foi com a primeira escrita, assim terá sido com as primeiras palavras eruditas. Mas como antes das formas eruditas existiram formas comuns e populares, suspeita-se que o nome dos primeiros deuses terá sido uma sílaba gutural semelhante aos guinchos dos macacos e das crianças antes começarem a palrear.

Assim a fonética não é a questão mais importante da linguagem porque as suas regras só são válidas para linguagens perfeitamente constituídas. O alfabeto fonético é um consenso adquirido pelo uso com o contributo dos falantes de ouvido mais atento e apurado e de voz mais afinada e melhor articulada. As formas fonéticas de sons claros e bem articulados, característica típica das línguas latinas, são tanto uma forma de boa chegada dum longo uso disciplinado da língua como um ponto de partida para línguas crioulas que delas derivaram por simplificação e abuso.

Os sumérios terão sido o primeiro povo a registar os sentidos correntes genéricos mais comuns do começo da história e a verdade não poderia de facto ter sido outra. Os genéricos correntes eram mesmo os do senso comum da época porque eram os mais usados na prática.

Os que podiam comprar, para ter alguma coisa, talvez lhe «coubesse» por sorte uma pequena e doce cerveja que em sumério era kašbir, literalmente urina humana, possivelmente de diabéticos. Colateralmente, abaixo da insustentável leveza do ser o senso-comum dos súbditos e escravos sumérios que no fundo foram os falantes mais numerosos que divulgaram a linguagem, terão aprendido a valorizar sobretudo o ter das migalhas que tombavam da mesa farta dos senhores paternais e terratenetes.

Kašbir = cervejeca; cerveja doce < kaš (urina) + bir (varão) = literalmente urina humana muito possivelmente com ressonâncias com o nome de *Kiash, deusa do fogo e das bebidas fermentadas que permitiam supostamente o acesso a saber os segredos dos divinos més.

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